quarta-feira, 1 de abril de 2009

Tipos de goleiros

Quem joga ou assiste futebol já sabe, mas para você que não joga, não assiste e tem raiva de quem o faz, eis aqui uma verdade fundamental do ludopédio: existem vários tipos de goleiro. E não estou falando só das tipificações básicas, como o meu e o adversário ou os bons e os frangueiros, mas das grandes diferenças de estilo, daquelas que marcam época.

Por exemplo, vamos pegar o começo da década de 90. A maior rivalidade era entre Corinthians e São Paulo, pois o Palmeiras ainda amargava o 14º ano da sua maior fila e o Santos vivia um limbo entre as duas gerações de Meninos da Vila. Ronaldo e Zetti envergavam a 1 no Parque São Jorge e no Morumbi, respectivamente. Ambos viviam grande fase e eram símbolos em seus clubes. Porém, dificilmente seria possível encaixar os dois em uma mesma categoria dentro do universo dos goleiros.

Zetti era sóbrio, Ronaldo era espalhafatoso. Zetti era articulado, Ronaldo era maloqueiro. Zetti seguia a máxima de seu treinador de goleiros, o monstro sagrado Valdir Joaquim de Moraes (em breve na seção de Lendas), que dizia que goleiro que voa muito é porque está mal colocado. Ronaldo dava ponte até em bola rasteira. Enfim, Ronaldo e Zetti encarnavam dois tipos completamente diferentes de goleiro.

Na minha visão, o Ronaldo é o cara que nasceu goleiro. Claro que ele treinava para se manter em forma, mas ele é o tipo de goleiro que mesmo com 40 anos e uma barriga de chope ia continuar fechando o gol nas peladas (está aí o Showbol que não me deixa mentir). Meu primeiro treinador de goleiros dizia que o Ronaldo havia sido descoberto jogando basquete no Corinthians, ao fazer uma série de lançamentos longos e roubar umas bolas. Não sei até onde é verdade, mas ilustra bem o ponto: o cara era goleiro até jogando basquete. Um goleiro ao natural, em estado bruto, do tipo instintivo. O russo Rinat Dasaev, o paraguaio José Chilavert e o camaronês Thomas N'Kono também me passavam a mesma impressão.

O Zetti, por outro lado, sempre me deu a impressão de ser extremamente dedicado e dependente dos treinos. Um cara que quando ia jogar no exterior tinha que fazer quedas no corredor do avião para não perder a forma. Ele também era capaz de fazer milagres (como na ida das oitavas da Libertadores de 94, quando parou Evair, Edmundo, Zinho & cia praticamente sozinho), mas suas defesas sempre me deram a impressão de serem friamente calculadas, como se ele traçasse mentalmente a melhor trajetória para interceptar o chute. Um goleiro que sempre tentava melhorar, progredir, do tipo aplicado. O belga Michel Preud'homme, o italiano Dino Zoff e o brasileiro Velloso também pareciam ser desse tipo.

Outro tipo de goleiro é o de fundamentos perfeitos. Waldir Peres, por exemplo, ficou conhecido pela facilidade de pegar penaltis e pela catimba com que irritava os batedores. O que pouca gente se recorda é da perfeição dos seus movimentos. Waldir sempre teve uma pegada segura, sabia trocar de mão com maestria e fazia quedas de manual. O problema desse tipo de goleiro é acabar sendo traído pelo excesso de confiança, como Waldir o foi naquele chute despretensioso do soviético Bal na Copa de 82. O dinamarquês Peter Schmeichel e o alemão Oliver Kahn eram desse tipo, assim como o chileno Roberto Rojas.

Mais um tipo: o goleiro operário. Aquele que é extremamente regular, quase não falha, mas também dificilmente faz milagres. É o cara que devia ter uma plaquinha do lado escrito "Estamos trabalhando há X dias sem acidentes". Fica mais difícil lembrar de exemplos nesse caso, pois a memória popular costuma se prender mais ao diferente que ao regular, mesmo quando a regularidade é fora do comum. Assim, esses goleiros costumam ser vistos pela torcida como mais discretos e 'esquecíveis', embora alguns se destaquem, como os brasileiros Paulo Sérgio, Carlos Germano e Maurício, assim como o argentino Luis Islas.

Outro tipo: o goleiro desengonçado. Geralmente muito alto, tem grande envergadura e elasticidade, costuma ser excelente em bolas cara-a-cara, mas se atrapalha com bolas no chão - na verdade, dá a impressão de ter preguiça de se abaixar para pegar as bolas rasteiras. Tem um jeitão meio displicente, parece até alguém pegando no gol só porque o goleiro faltou. O brasileiro Dida se encaixa nesse perfil, assim como o argentino Sergio Goycochea e holandês Ed de Goey.

Outro tipo: o goleiro espetáculo, daqueles que parecem mais preocupados com a plástica da defesa do que com a segurança da meta. Lógico que nem sempre é proposital, mas a escolha de defesa desse tipo de goleiro costuma ser a mais arriscada possível. O sueco Thomas Ravelli, o colombiano René Higuita e belga Jean-Marie Pfaff eram verdadeiros entertainers ludopédicos, mas o brasileiro Danrlei também cabe na lista.

WARNING: Essa segmentação é baseada apenas e tão somente na minha opinião. Além disso, ela não avalia em nenhum momento a qualidade dos goleiros. Independente do tipo, todo goleiro tem seu dia de deus hindu de muitos braços, quando sai de campo coberto de glórias e apelidos. Todos os goleiros citados foram muito bons, senão não seriam lembrados 5, 10, 15, 20 anos depois de pararem de jogar.

Uma lista como essa é viva e vai crescendo de acordo com o que a memória permitir. Por isso, segue um apanhado geral, com alguns goleiros em atividade para ilustrar cada tipo:

  • Instintivo - Buffon, Rogério Ceni e Marcos
  • Aplicado - Cech, Van der Sar e Victor
  • Fundamentos perfeitos - Casillas, Toldo e Doni
  • Operário - Pepe Reina, Palop e Magrão
  • Desengonçado - Gomes, Hélton e Lauro
  • Espetáculo - Felipe, Fábio Costa e Victor Valdés

4 comentários:

  1. Me encaixaria mais no desengonçado. Meu ponto fraco são as bolas rasteirinhas.

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  2. A título de curiosidade, qual o estilo do proprietário do blog?

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  3. ótimo blog , Goleiro uma vez , Sempre Goleiro

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