terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Capítulo 15

Deitado em seu colchão d’água no quarto de sua penthouse, J. P. Alphonsus sentiu uma súbita necessidade de repassar mentalmente pela enésima vez a situação, exatamente como iria apresentá-la ao professor de manhã. Afinal, a última coisa que queria era passar a impressão de ser um amador no assunto. Como começaria a história mesmo? Ah, sim, pelo começo.

Ele, J. P. Alphonsus III, é o dono-presidente-CEO da JPA3 Empreendimentos, uma empresa que controla grande parte das lojas da maior região de comércio a céu aberto do Brasil: a 25 de Março. Para ser exato, 91% das lojas, com exceção das Galerias Pagé, que são controladas por um clã sul-coreano, os Kim. Ele e os Kim eram rivais ferrenhos, competindo nos últimos anos por cada centímetro disponível, mas um perigo mútuo havia unido os fidagais adversários.

Nos últimos meses, uma série de misteriosos assassinatos tinha acontecido na Ladeira Porto Geral, que fica bem no coração da região da 25 de Março. A polícia, apesar dos gordos incentivos oferecidos por ele e pelos Kim, não conseguira avançar nas investigações. A sensação de insegurança tinha reduzido substancialmente o movimento e havia um grupo de políticos oportunistas que propunha fechar o que chamavam de “aquele antro de comércio ilícito”, alegando que ele atraía a violência para o seio da nossa pacata cidade.

Porém, para a JPA3, essa era a pior época possível para que isso acontecesse. Ele tinha acabado de investir uma larga soma na revitalização das lojas e em propinas para os fiscais da prefeitura. Havia contraído alguns empréstimos, contando com o movimento constante dos dias normais e os picos dos feriados, cuidadosamente mapeados ao longo dos anos. Se já não bastasse esse assassino espantando seus clientes, agora a prefeitura ameaçava fechar a rua e mudar o zoneamento! Se isso ocorresse, mesmo provisoriamente e por pouco tempo, a falência seria certa. Sua única esperança era pegar o assassino. Por isso chamara o senhor, professor Longdon.

Não fora noticiado na imprensa para evitar o pânico, mas as pistas colhidas pela polícia indicam que todos os assassinatos tinham sido perpetrados pela mesma pessoa. Os principais suspeitos até então eram os camelôs ilegais, mas não havia provas conclusivas contra eles.

Bom, o caso é esse. Mas e se ele quiser saber de mim, de onde vim? Afinal, o cara é fascinado por história! Bom, J. P. é de Johann Peter, que foi o nome de meu bisavô por lado de pai. A família era aristocrática, mas tinha dilapidado quase todo o patrimônio em futilidades. Ele, J. P. Alphonsus, conseguira reconquistar parte da fortuna investindo no mercado varejista em larga escala. Tudo começara com a coleção de lenços de seda do avô. Todos os 374 lenços tinham o ‘JP’ bordado a ouro no canto e, por lógica, acabaram sendo sua parte da herança. Pois bem, através de uma parceria com uma costureira, transformou os lenços em roupa de cama: 17 jogos completos de casal de patchwork de pura seda. Dera 100 reais pra costureira e, com o restante, comprou uma loja de tecidos na 25 de Março. Em pouco tempo, com os lucros, comprou outra. E mais outra. Em 3 anos, chegara aos mais de 90% das lojas da 25 e região, com exceção das Galerias Pagé. Além das lojas próprias, a JPA3 Empreendimentos recebia uma % de cada loja alugada na 25, o que permitia uma vida confortável a seu dono-presidente-CEO.

Sim, a vida era boa, mas tudo isso agora estava ameaçado. Só você pode me ajudar, Mr. Longdon. Não, Rupert. Ou será que fica forçado demais? Melhor chamá-lo só de professor Longdon.

1h43 da madrugada. Essa história já estava dando insônia. Engoliu dois Rivotril com um gole de bourbon e mergulhou em um profundo sono sem sonhos.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Capítulo 14

A alguns quilômetros dali, nossos heróis desciam a Haddock Lobo dentro de um táxi. O homenzinho ia no banco da frente, claramente cansado, enquanto Longdon passeava o olhar pelas ruas desertas dos Jardins. Como que para confirmar o clima melancólico, o rádio tocava baixinho um hino evangélico.

Com o espírito alquebrado pelas desventuras do dia, o professor pensava se tinha sido sensato aceitar a maldita proposta. Viajara para esse arremedo de civilização sem nenhuma garantia de que receberia a grana prometida e, para piorar, não fazia nem um dia que chegara e já tinha encarado a morte de frente em três oportunidades! Sem falar que só vira sujeira e pobreza até agora, nada de misterioso ou instigante. Nem uma pista, nem um enigma, nada! Se bem que a região agora parecia ser um pouco melhor. A rua é arborizada, tinha uma loja da Bulgary aqui e uma Cartier mais para frente. Mesmo assim, era muito pouco para diminuir aquela sensação de o-que-é-que-eu-tou-fazendo-aqui que ardia em seu peito desde que deixaram o Metrô. De repente...

- STOP THE CAB!!!!!!

O taxista, alarmado pelo grito, enfiou o pé no freio. O homenzinho olha para trás e vê Longdon com o rosto colado no vidro, olhando embasbacado para a loja da esquina. No segundo seguinte, o professor abre a porta e, pulando a corrente que protege o estacionamento da loja, aproxima-se da vitrine.

Paola Da Vinci! A prima mais velha de Leonardo, que o iniciou nas artes do amor e para quem mais tarde ele arrumou um empreguinho com os Médicis! Diziam as más-línguas que graças a um enrosco com o jovem Lorenzo ela galgara o posto de camareira-chefe da ala das crianças na mansão de Florença. Quem diria que entre os nativos daqui vivesse alguém que conhecesse sua história e prestasse essa singela homenagem. Parecia inacreditável, mas a vitrine da loja não deixava sombra de dúvidas, cheia de roupas de criança, toalhas e lençóis.

Sentindo seu entusiasmo renascer, Longdon voltou ao táxi, pensando no misterioso autor da homenagem. Teria algum membro do Priorado de Sião errado o caminho ao imigrar para a América e vindo parar aqui? Pobre coitado, esse exílio deve ter sido um castigo pior que as fogueiras da Inquisição!

Perdido em suas lucubrações, Longdon retomou seu lugar no táxi. O homenzinho estava cansado demais até para questionar que diabos fora aquilo, se nem xixi na árvore o homem fizera e o motorista estava sendo bem pago para não fazer perguntas.

No rádio, aos sussurros, um pastor tentava exorcizar por telefone o demônio de um ouvinte.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

O maravilhoso mundo dos bebês

Em verdade, eu vos digo que os bebês são criaturas oniscientes e permanecem assim até que comecem a se comunicar apropriadamente. Sim, eles sabem tudo, passado, presente e futuro, o sentido da vida, o universo e tudo mais, só não vão contar para você - até porque tem muita coisa mais interessante no mundo para se analisar, discutir e, claro, morder. Quem quer saber o campeão da Copa-2010 ou as dezenas da Mega-Sena quando se tem uma joaninha de pelúcia, com asas que fazem barulho, bem ao alcance da boca?

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Revendo os pitacos - a contagem final

Eis que o Brasileirão mais disputado da era dos pontos corridos chegou ao fim, trazendo consigo a tão esperada hora de medir a eficiência do pitaqueiro (para ter idéia de onde isso saiu, veja aqui e aqui).
-------------------------
LEGENDA:
Rebaixamento - entre o 17º e 20º lugar
Limbo - entre o 12º e o 16º lugar
Sul-americana - entre o 5º e o 11º lugar
Libertadores - entre o 2º e o 4º lugar
Título - 1º lugar
Em itálico - chute inicial
Em itálico e negrito - palpite
Normal - placar dos chutes

Atlético/MG - toda vez fico na expectativa do Tardelli estourar, mas acho que Sul-americana tá de bom tamanho.
Pode-se até dizer que o Tardelli estourou e o time liderou boa parte do turno. Mesmo assim, tá difícil levar o Galo a sério na briga pelo título. Acho que subiu um degrau e deve lutar pela Libertadores. 1 alterado.
6º - 1 errado, mas por pouco

Atlético/PR - se ano passado foi a vez da do Eurico, esse ano é a herança maldita do Petraglia que vai se manifestar. Rebaixamento.
Olha que ainda é possível. O time vem se recuperando calcado na boa fase do Paulo Baier - algo que o Goiás de 2007 também fez e só não caiu por causa do Corinthians. 1 alterado e 1 mantido.
14º - 2 errados, por pouco de novo

Avaí - não é aqui...surfe...Guga...ok, na quarta coisa que veio à mente, chegamos ao futebol: importou um meio-campista para a Coléia pra jogar com meu irmão. Não que impacte na campanha deles, que deve ficar no Limbo.
Surpreendente. Podemos estar testemunhando o nascimento de um grande técnico. Agora, acho que leva a Sul-americana sem esforço. 2 alterados e 1 mantido.
7º - 2 errados e 1 certo, na mosca

Barueri - inovar é uma coisa, inventar moda é outra completamente diferente. Três caras tomando conta de algo dá besteira desde os idos de março, com Julio César, Marco Antônio e Otávio. Rebaixamento.
Eis o time exceção para confirmar todas as regras. Atrasa salários, trocou 3 treinadores (e foi trocado por 1), vendeu seu jogador símbolo para as arábias e mesmo assim, continua brigando pelas cabeças. Acho que logo, logo a sorte muda e ele briga para ficar no Limbo. 3 alterados e 1 mantido.
11º - 3 errados, esse foi longe, e 1 certo

Botafogo - tem mais time e mais técnico que no ano passado, mas não dá a impressão de que vai melhorar o desempenho. Sul-americana.
Não tem mais técnico anymore e o time, que no papel é razoável, vem refugando sistematicamente. Forte candidato ao Rebaixamento. 4 alterados e 1 mantido.
15º - 4 errados, graças ao Palmeiras, e 1 certo

Corinthians - torço pelo Ronaldo tanto quanto torço contra Chicão, Felipe, Cristian e Mano. Queria que o Fenômeno fosse o artilheiro do campeonato e só, mas acho que briga pelo Título. Ronaldo mais ficou fora do que jogou até agora e a diretoria promoveu um yard sale de meio de temporada digno dos Perrela. Apesar disso, o time continua forte (Elias está muito acima da média, a zaga é boa e Dentinho também) e ainda acho que incomoda na briga pelo Título - até porque é a única coisa que ainda o motiva esse ano. 4 alterados e 2 mantidos.
10º - 5 errados, esse bem longe, e 1 certo

Coritiba - impressionante na Copa do Brasil, nem parece que perdeu a referência no ataque. Dá até pra pensar em Libertadores.
Entrou em crise após a eliminação da Copa do Brasil e comprometeu o início do Brasileirão. Tem um bom time, mas já trocou de técnico e está brigado com a torcida. Acho que se estabiliza logo mais e fica no Limbo sem maiores sustos. 5 alterados e 2 mantidos.
17º - 6 errados, graças ao Palmeiras², e 1 certo

Cruzeiro - medo. A cada ano que passa o time melhora. Título.
Ficou irreconhecível após perder a Libertadores, mesmo ainda tendo um time forte após as tradicionais vendas de meio do ano. Fica mais difícil ter medo de um time que contrata 4 laterais esquerdos medalhões e efetiva na posição um garoto vindo dos juniores - que vem jogando muito bem, diga-se de passagem. Sul-americana. 6 alterados e 2 mantidos.
4º - 7 errados, graças ao Palmeiras³, e 1 certo

Flamengo - eu acredito no Adriano. Não, em duendes não. Libertadores.
Eu ainda acredito no Adriano, assim como o Dunga. Briga pela Libertadores. 6 alterados e 3 mantidos.
1º - 8 errados, graças a uma arrancada empolgante, e 1 certo

Fluminense - no papel, é forte (Conca e Fred!), mas o papel só joga na semi da Copa da UEFA. Sul-americana.
Conca tem jogado menos que bolinha de papel e Fred machucou - não que estivesse bem antes disso. Além disso, touxe de volta Renato Gaúcho, que pode conseguir um pouco invejável bi-Rebaixamento. 7 alterados e 3 mantidos.
16º - 9 errados, graças a uma arrancada empolgante², e 1 certo

Goiás - o Iarley é ótimo, mas acho que o resto não acompanha. Terá sorte se ficar no Limbo.
Não só o resto vem acompanhando muito bem como o clube ainda repatriou o cobiçado Fernandão, bem nas barbas de Palmeiras, São Paulo e Inter. Porém, sua campanha em casa não inspira muita confiança e creio que na reta final vai se contentar com a Sul-americana. 8 alterados e 3 mantidos.
 9º - 9 errados e 2 certos, esse na pinta

Grêmio - o Souza tá jogando tanto que nem lembrava que o Tcheco ainda está lá. Título.
O time continua bom, mas o bloqueio psicológico fora de casa impossibilita qualquer grande aspiração. Sul-americana. 9 alterados e 3 mantidos.
8º - 9 errados e 3 certos, outro na pinta

Internacional - o melhor time do país pelo 3º ano seguido. Porém, acho que dessa vez vai brigar pelo Título.
Ainda deve brigar pelo Título, mas parece que perdeu a inspiração. Não é mais o favorito. 9 alterados e 4 mantidos.
2º - 9 errados e 4 certos, mais um na pinta

Náutico - passou raspando too many years. Esse é o ano deles. Rebaixamento.
Apesar da interessante teoria do André Kfouri, de que o time não cai pelo know-how da situação, continuo achando que esse é o ano deles. Rebaixamento. 9 alterados e 5 mantidos.
19º - 9 errados e 5 certos, bulls-eye

Palmeiras - ataque ganha jogo, defesa ganha campeonato. No máximo, briga pela Libertadores.
Trocou Keirrison por Obina, mandou Luxemburgo embora e, depois de uma minissérie, trouxe Muricy. Enquanto isso, o time chegou à liderança e abriu vantagem, sagrando-se campeão do 1º turno. Acredito que o ritmo vai cair um pouco e o time acaba brigando pela Libertadores. 9 alterados e 6 mantidos.
5º - 10 errados, graças ao Palmeiras⁴, e 5 certos

Santo André - uns 5 anos de atraso. Em 2004 um time com Gustavo Nery, Marcelinho Carioca e Rodrigo Fabri seria favorito ao título. Rebaixamento.
Ainda mandou embora o Sergio Soares, um dos únicos profissionais promissores do time. Rebaixamento mesmo. 9 alterados e 7 mantidos.
18º - 10 errados e 6 certos, na mosca

Santos - time bom e técnico inovador. Só duvido que a torcida tenha a paciência necessária. Deve ficar na Sul-americana.
Nem a torcida, nem o presidente tiveram paciência - e olha que o técnico nem se mostrou tão inovador assim. Ainda tem um time bom e corre o risco do Luxemburgo tirar alguma coisa da cartola, mas não deve passar da Sul-americana. 9 alterados e 8 mantidos.
12º - 10 errados e 7 certos, mais uma drosophila abatida

São Paulo - tríplice coroa, a de verdade, com título nacional, continental e mundial. Espero nada menos que o Título, fora o baile.
Não deu para tentar a tríplice coroa e a era Muricy terminou com o time beirando a zona de rebaixamento. Para piorar, contratou-se o Ricardo Gomes, que não tem um currículo muito animador. Mas não é que deu certo? Ainda acho que a diretoria 'diferenciada' acerta mais por sorte que por planejamento, mas o time voltou a ser forte candidato ao Título. Inclusive o mais forte, na minha humilde e isenta opinião. 9 alterados e 9 mantidos.
3º - 10 errados e 8 certos, tínhamos chance até o intervalo do último jogo

Sport Recife - a Bombonilha não é mais aquela. Sul-americana.
Nem a Bombonilha, nem os antes ótimos Magrão, Durval, Dutra, Ciro e um longo etc. Nunca uma Libertadores fez tanto mal a um time. Rebaixamento. 10 alterados e 9 mantidos.
20º - 10 errados e 9 certos, mais um bulls-eye

Vitória - Carpegiani não dá confiança. Limbo.
Eis um caso de errar acertando: no 1º Turno, o Carpegiani foi principal o responsável por levar o Vitória à briga pela liderança, muito acima do que poderia se esperar. Daí, o time perde uma seqüência de pontos normal para um time do limbo e a diretoria megalomaníaca manda o cara embora. Resumindo, se o Carpegiani continuasse lá, eu mudaria o palpite. Como ele caiu, cravo no Limbo. 10 alterados e 10 mantidos.
13º - 10 errados e 10 certos, para fechar redondo
-------------------------

E o Told You So Index alcançou impressionantes 50%, assim como havia sido na 19ª rodada. Em um campeonato cheio de altos e baixos como esse, só se encontra consistência mesmo aqui, Onde Não Nasce Grama.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Traição

Poucas coisas nesse negócio de ser pai são mais difíceis que a tal da vacina. Você leva sua bebê na clínica ou no posto, toda risonha e feliz, brincando e sorrindo para tudo. Ela encanta todo mundo, da recepcionista à médica, e olha para você com aquela cara de felicidade plena que só os bebês tem. Sim, a vida é bela e colorida.

Mas eis que chega a hora da verdade. Você segura a perna dela no lugar (e tem que ser você. A enfermeira fica com a seringae a mãe praticamente vira de costas para não ver) e ela pensa que é uma brincadeira, dá risada e tenta se soltar. Daí vem a picada, aquela que você sabia o tempo todo que viria, mas fingia que não era nada, que ela nem ia sentir.

Você vê o sorriso se transformar em um esgar de dor. Os olhinhos, que há poucos segundos brilhavam, enchem-se de lágrimas. Ela está olhando bem nos seus olhos e, chorando, tenta te dizer "papai, isso dói! Faz parar!". Daí ela percebe que ao invés de ajudá-la a fugir, você a está prendendo no lugar. Você é um deles.

Aí é que vem o pior. A picada já passou e ela olha para você com uma cara de decepção, de quem foi traída cínica e friamente por alguém em quem confiava a vida. E você não tem nem como explicar que é para o bem dela, que você não é um sádico espetador de bebês.

Sério, pior que isso só se ela pegasse uma das 817 doenças que a dita cuja previne.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Agradecimento

Independente do que acontecer no domingo que vem, deixo aqui meu agradecimento aos jogadores que ajudaram a resgatar a temporada do São Paulo esse ano. Hugo, Borges, Washington, Junior Cesar, Renato Silva, Bosco, MarlosDagoberto foram, em um momento ou outro, execrados pela torcida, mas responderam do melhor jeito possível: dentro de campo, levando um time que era cotado para brigar contra o rebaixamento (mesmo que os comentaristas agora jurem o contrário) até as portas do título.

Pena que não deu para ganhar do Goiás para redimi-los, mas fica aqui meu muito obrigado. Aos que se vão, boa sorte por onde forem e aos que ficam, simbora que ano que vem tem mais.

P.S. (1) - Não estou diminuindo a importância de Hernanes, Jorge Wagner, Rogério, etc, apenas destacando os que costumam levar as pedras injustamente.
P.S. (2) - Já fiz as contas para o final apoteótico: basta o Santo André segurar o Inter, o Grêmio reeditar o América-MEX (o que pode acontecer principalmente se for simultaneamente - quando anunciarem no Maracanã que o Inter está perdendo, o Grêmio vai se soltar e o Flamengo, sentir a pressão), o Palmeiras ganhar de no máximo um gol do Botafogo (o que é plausível, uma vez que os cariocas ainda brigam contra o rebaixamento) e nós enfiarmos 5 no Sport. Simples como acertar a Mega da Virada sozinho.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Capítulo 13

Em seu luxuoso escritório no 39º andar, J. P. Alphonsus gastava o tapete persa andando de um lado para o outro incessantemente. Felizmente não era noite de pôquer, pois pela segunda vez no mesmo dia seu rosto demonstrava claramente as incertezas que lhe corroíam por dentro.

Onde estava o americano? Fazia horas que eles haviam saído de Cumbica! Por pior que fosse o trânsito, já deviam ter chegado há algum tempo. Acendeu mais um charuto, sentou-se e ligou a TV, zapeando os canais de notícias em busca de uma explicação para o atraso. Aparentemente, nada fora do normal acontecia em São Paulo naquela noite. Um acidente na Marginal Tietê parecia monopolizar as atenções do helicóptero da emissora, mas só. Não, um acidente seguido de assassinato, dizia o repórter. De qualquer forma, nada que justificasse o atraso! Será que eles haviam sido seguidos? Capturados? Seqüestrados? Só falta ele arranjar problemas com a embaixada norte-americana pelo sumiço do professor...

Subitamente, de seu celular começou a emanar uma música maviosa...um coral de virgens semi-nuas às margens de um lago sob a luz do luar, cantando ‘Where Is The Love’ do Black Eyed Peas. J. P. Alphonsus sempre escutara até as virgens chegarem no refrão, mas hoje ele estava ansioso demais. Viu no visor o número que chamava e atendeu.

- Onde diabos vocês estão?!?...quê?... sim...não, de jeito nenhum…certo, leva o cara para um lugar seguro e traz amanhã cedo aqui no escritório. E sem desculpas dessa vez!

Apertou o botão de desligar do celular com força. Sua mão ainda tremia levemente, mas seu coração já começava a desacelerar.

Quem inventou o celular não pensou que estava privando o mundo da melhor forma de desestressar existente, pensou enquanto trancava o escritório. Afinal, por mais força que se use para desligar um celular, mesmo os de flip, nunca se teria um prazer igual ao de se bater o telefone na cara de alguém.

Ainda ruminando sobre esse fragmento filosófico, J. P. Alphonsus subiu de elevador o andar que o separava de sua penthouse secreta. Depois de toda essa tensão, hoje não era dia de enfrentar a esposa e os filhos.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Capítulo 12

Após alguns segundos recuperando o fôlego, Longdon abre os olhos e vê que todo o conteúdo da sua mala se espalhara pelos quatro cantos do vagão na queda. Com o auxílio do homenzinho, ele começa a recolher seus pertences, desculpando-se profusamente com uma senhora sobre a qual havia aterrissado seu frasco de shampoo para cabelos oleosos. Os demais passageiros permaneciam impávidos em seus lugares e, felizmente, ninguém mais havia sido atingido.

Nossos heróis levaram trinta minutos e cinco estações para reunir os restos mortais da bagagem – e Longdon ainda sentira falta da coleção “Esmiuçando o Código Da Vinci”, de 13 volumes, sem a qual não viajava para não ser pego desprevenido por alguma pergunta capciosa. Assim que fecharam a mala, o homenzinho fez um sinal indicando que era hora deles descerem e uma voz cansada anunciou a Estação Liberdade. Longdon, abraçado em sua mala, seguiu o homenzinho para a porta do vagão.

Quando a porta se abre, o professor se depara com uma multidão de olhos amendoados na plataforma! Tomado pelo pânico, vendo em cada um deles um cúmplice de seus perseguidores, Longdon agarra o braço de seu guia com uma mão e o cano de apoio do trem com a outra, sem nem se importar com a mala que se abre novamente ao cair no chão.

- Ficou louco, homem? É aqui que a gente desce! – pondera o homenzinho, tentando livrar o braço.

- Quem ficou louco foi você! Não viu que vamos mergulhar nas hostes do inimigo?

- Que mané hostes! A Liberdade é o bairro japonês de São Paulo! Nossos inimigos são uma gangue de coreanos e um negão de dois metros de altura! Vamos descer antes que feche a porta!

- Well, não acho que essa pequena diferença geográfica seja o suficiente para arriscar minha preciosa vida. Afinal, o símbolo máximo de um país é a sua bandeira e as bandeiras de Japão e Coréia são parecidas as hell!

Enquanto os dois discutiam, as portas voltaram a se fechar e o trem acelerou. Aliviado, Longdon sentou no banco, observando pela janela as pessoas que iam ficando para trás. Com a testa apoiada no vidro da porta, o homenzinho murmurava alguma coisa relativa a pedras e cruzes quando um estrondo atraiu a atenção de todos os passageiros!

Na plataforma de embarque, dois coreanos corriam para emparelhar com o trem e um deles tentava quebrar o vidro da porta com a coronha do revólver. Vendo que o trem se aproximava do túnel, os coreanos desistem da perseguição e correm em direção à saída.

Longdon não abriu a boca, mas em seu rosto o homenzinho pode ler claramente um maroto ‘eu não disse?’.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Incentivo para o lado certo

Li há pouco uma manchete no Globo.com dizendo que as escolas com melhor participação no ENEM tiveram aumentos de 10%. Nem li a matéria, mas ela me deu uma idéia: e se o MEC vinculasse os aumentos em mensalidades às notas de avaliação dos cursos? Ou seja, cada escola precisaria garantir que seus alunos tirem uma nota mínima no ENEM para poder reajustar suas mensalidades no ano seguinte. Quanto maior a nota, maior o reajuste. Notas baixas acarretam em uma redução das mensalidades e, abaixo de um certo nível, fazem a escola perder a licença.

Acredito piamente no conceito de amarração de objetivos, de direcionar as ações através de incentivos. Na maioria das empresas, por exemplo, os funcionários tem suas metas dizendo quais são suas prioridades e qual é o nível de qualidade esperado. Se melhorar a qualidade do ensino é realmente uma prioridade, por que não fazer com que as escolas saibam disso, recompensando exatamente as que conseguem atingir o objetivo?

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Pensamentos profundos (ou Para não falar do Belluzzo)

Hoje vi uma pichação em um muro da Av. Paulista dizendo que "A Revolução virá de Bicicleta". Se for assim, ela vai ser muito fácil de ser debelada. Basta os contra-revolucionários irem de ônibus!

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

O Porco, o Urubu, o Galo, a Raposa e as Uvas

O Galo foi o primeiro: chegou lá e plantou a parreira (não confundir com o Parreira). Depois, o Porco espantou o Galo de lá e sentou para esperar a parreira crescer. E ainda bem que esperou sentado, pois esse tipo de uva demora 38 rodadas para amadurecer.

Rodada vai, rodada vem e o Porco continuava lá, firme e forte. Os outros animais até rondavam a parreira - que já estava vistosa e com um cacho recém-nascido - mas ninguém ousava se aproximar do Porco mal-humorado. O Galo até que ficava por perto, mas nunca perto o bastante para irritar o suíno.

Só que, como ver parreira crescer é um tédio só, o Porco pegou no sono. E bem na hora que o cacho começava a ficar apetitoso. O Galo voltou a se aproximar, assim como o Urubu e até a Raposa, que tinha desdenhado dessa uva na hora do plantio, enfeitiçado que estava pela variedade continental.

Ainda faltam 4 rodadas para as uvas estarem maduras, mas o Porco ainda não acordou - há inclusive reclamações de que ele tenha sido sedado por um vigarista. O Urubu deu uma tunda no Galo dentro do seu terreiro e ameaça levantar vôo em direção ao cacho, mas ainda não está livre de perigo - mesmo porque tem que se preocupar também com os botes da Raposa.

Sentado em uma nuvenzinha ao lado da parreira, o Santo assiste tudo com um olhar divertido.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Diário da Lui - 06/11

Eu já descobri isso faz um tempo, mas só agora lembrei de contar: meu quarto tem uma janela mágica! É verdade, toda vez que o papai ou a mamãe abrem, ela mostra um mundo diferente lá fora. Quer dizer, é tudo muito parecido, mas se você prestar atenção, vai ver que é diferente.

Por exemplo, às vezes o céu é cinza, às vezes é azul e, quando eu saio do banho, quase sempre ele é preto. E tem mais: às vezes as árvores estão de pé, às vezes deitadas...às vezes tem um barulhão de carro, às vezes dá até para ouvir os passarinhos...às vezes vem um ventinho gostoso no meu rosto, às vezes tá chovendo...

O problema é que lá em casa só a minha janela é mágica. A porta da frente não é. Toda vez que a gente sai por ela, cai sempre no mesmo mundo, desce de elevador e entra no carro. E o carro é legal, tem a minha cadeirinha e meus brinquedos, mas é sempre o mesmo.

Vou ver se convenço a mamãe a sair pela janela amanhã.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Status do Brasileirão 2009

Depois da 32ª rodada, parece que o Campeonato Brasileiro virou uma briga caseira entre o São Paulo e Muricy Ramalho para ver quem é o primeiro tetra-campeão seguido. Claro que 6 rodadas é uma vida, mas acho que agora começou o sprint final do campeonato.

Mas o pior de tudo é o dilema do corinthiano nesse domingo. Se perde, ajuda o Palmeiras. Se ganha, ajuda o São Paulo. E agora, José?

------------------------
Atualização pós-clássico
E não é que o Corinthians arrumou uma solução salomônica? Um empate que zera a gordura de um e tira a liderança do outro. Missão cumprida: nenhum dos torcedores rivais ficou satisfeito com o resultado.

Aliás, perdemos outra chance de ter um alinhamento cósmico na tabela. Se o Palmeiras perdesse do Corinthians e o Inter ganhasse do combalido Botafogo, teríamos uma escadinha do 1º, com 58, ao 5º, com 54.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Capítulo 11

Estava de volta ao corredor estreito, afogado pela multidão, sem ter para onde ir. Sentia algo tampando seu nariz e teve certeza de que morreria em pouco tempo, quando sentiu uma mão o agarrando pelo ombro e o sacudindo.

- Mano, cê tá muuuito louco, hein? Tá tentando cheirar o saco de lixo! Sério, velho, nunca pensei que fosse achar alguém num naipe pior que o meu, mas cê bate todos os recordes!

Olhou em volta lentamente, procurando o corredor, as vitrines, a multidão e não encontrou nada. Estava em um beco sórdido, só de cueca, deitado de bruços em cima dos sacos de lixo, entre um mendigo dormindo e um drogado sorridente. Lembrou de ter parado no semáforo quando estava indo para a padoca. Lembrou de ser agarrado por dois homens e de ver que um deles era japa. E lembrou também de...

Esticou a mão para trás, tentando alcançar o local da facada. Sentiu uma pontada de dor, mas não encontrou nem a ferida nem sentiu sangue escorrendo. Para falar a verdade, a ponta dos seus dedos estava congelada, por isso era difícil descobrir qualquer coisa pelo tato. Mas talvez não fosse uma ferida fatal, no fim das contas!

Não tinha idéia de quanto tempo ficara desacordado, apenas sentia um frio miserável e uma fome dos infernos. Seu estômago roncava tão alto que ecoava pelo beco sórdido. Ao seu lado, o cara sorridente falou:

- Ih, ó o cara! Mó larica, hein? Chega aí, eu tenho uns docinhos pra essas horas...

Rachou com o drogado uma pipoca doce Aritana e, lentamente, sentiu que as forças retornavam, embora o frio persistisse. Do outro lado, o mendigo acordou, tomou um trago de uma garrafa num saco de papelão e dormiu de novo. Sua mão segurava a garrafa como um torniquete, mas de debaixo de seu braço escorregou um pacote com seus pertences.

Era um homem honesto, mas nessa hora descobriu que seus escrúpulos não sobreviviam a temperaturas muito frias. Assim, murmurando desculpas para enganar a própria consciência (um ‘é só um empréstimo’ e um ‘depois eu devolvo’, para ser exato), pegou o paletó que estava por cima do pacote e o vestiu. O cheiro não era tão ruim, principalmente comparado ao lixo da padoca, mas o mais importante é que ele era forrado por dentro.

Bom, a fome e o frio já não eram problema, mas ele ainda precisava chegar ao hospital o mais rápido possível. Como que para ilustrar esse pensamento, um espirro lhe subiu do fundo da alma e ecoou pelo beco sórdido. Com a sabedoria de quem vivia nas ruas, seu comunicativo novo amigo diagnosticou, ainda mastigando os últimos piruás:

- Rapá, isso é gripe suína! Eu sei por que um amigo meu teve também! Ele passou umas duas semana dando esses espirro louco e, de repente, amanheceu morto. Com as mãozinha pra frente, assim, que nem um leitão assado. Cê precisa ir no médico logo!

- E como é que eu vou no médico assim? Sem calça e sem um puto no bolso?

- Olha, quando eu acho que tou doente, eu procuro algum acidente de carro ou atropelamento e deito do lado das vítimas. Às vezes a ambulância me leva junto.

Não era má idéia. Levantou-se, agradeceu ao drogado e encaminhou-se para a rua principal. Para sua sorte, viu que um motoqueiro tinha sido atropelado por um ônibus e estava esparramado no chão. A sirene de uma ambulância já soava nas redondezas.

Não havia tempo a perder! Precisava chegar antes da ambulância e deitar no chão sem que os outros percebessem. O som da sirene estava mais alto, mas ainda dava tempo. Seus olhos ainda não tinham se habituado à claridade, quando ele desatou a correr para o local do acidente.

De repente, ao som da sirene se juntou o de uma buzina. Ele mal havia dado dois passos pela rua quando foi atropelado em cheio pela ambulância e caiu desacordado ao lado do motoqueiro.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Diário da Lui - 27/10

Hoje eu pus um babador da mesma cor do babador do papai. Só que o do papai é esquisito. É fino e comprido, vai até a cintura dele. O papai deve ter muita mira para babar sempre no lugar certo.

Ah, hoje eu também aprendi a colocar e tirar a chupeta da boca! A mamãe ficou maior feliz! Tirar é muito fácil e eu já sei faz tempo, é só enganchar o dedo na argola da chupeta e puxar. Colocar também não é difícil, só tem que mirar bem a boca, esticar o bico e empurrar a chupeta com a mão.

Não sei por que a mamãe e o papai reclamam tanto de ter que colocar minha chupeta de volta de noite. É tão fácil!

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Habemus Campeonatum

O Palmeiras foi muito gente fina e resolveu esperar os demais times chegarem para irem todos juntos até o final. Atlético-MG, Inter e São Paulo, gentlemen que são, também se quedaram à espera de Flamengo e Cruzeiro. Só o Goiás deu uma de furão e ficou pelo caminho.

Agora, arrependido mesmo deve estar o Mano Menezes, que jogou a toalha na 18ª rodada do Brasileiro. Na época, o Corinthians estava três pontos na frente do Cruzeiro...

P.S. - Por muito pouco não tivemos outro alinhamento cósmico na tabela de classificação. Caso o Inter ou o SPFC tivessem empatado e o Goiás tivesse ganho, teríamos uma escadinha de um ponto do 1º ao 7º lugar. Se bem que dessa vez, foi melhor não ter acontecido. Vai que a Globo usa isso de pretexto para a volta imediata dos mata-matas.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Palmeiras Jaiminho

Todo ano, quando é divulgada a tabela do Brasileirão, eu faço uma mega-ultra-planilha no Excel com os jogos e uma classificação que atualiza automaticamente, permitindo simular os resultados. É uma coisa simples, rápida e profundamente desestressante. Mas eu divago.

A questão é que eu fiz uma série de simulações na minha mega-ultra-planilha e descobri o por quê do Palmeiras estar desinteressado dos pontos ultimamente: é para evitar a fadiga. Sim, pois se todos os seus adversários diretos perderam todos os seus jogos (menos os contra ele, Palmeiras) e empatarem nos confrontos diretos, o título vai para o Palestra Itália mesmo que o alvi-verde não faça mais nenhum gol! Claro que é possível, você não viu as últimas rodadas do campeonato?

A nação alviverde agora deve focar suas energias em secar os seus concorrentes e torcer por um empate toda vez que dois deles se enfrentarem. Algum desavisado pode até dizer que cansa mais sofrer em nove jogos do que em um só, mas eu lhe asseguro, caro desavisado, que isso é muito menos estressante que torcer para que o Obina erre a trave ou o Edmilson ganhe do Petkovic na corrida. Com toda certeza.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Capítulo 10

Ao checar a carteira, o homenzinho notou que só tinha mais um bilhete de metrô e se encaminhou à bilheteria para adquirir outro. De repente, ele parou, com um leve tremor no bigode e uma expressão anuviada no rosto. Longdon quase tropeçara em seu diminuto guia e, intrigado, procurou a causa dessa inesperada demonstração de emoção. Examinou com atenção a vending machine de livros de bolso bem na sua frente e, com sua perspicácia habitual, notou que o homenzinho parecia olhar fixamente para um livro chamado “Você é do Tamanho dos Seus Sonhos”. Realmente, o título era insensível e de extremo mau gosto. After all, pensou, quem tem mais direito aos grandes sonhos que os pequenos homens?

O homenzinho, no entanto, estava mais preocupado com o negão na fila da bilheteria, que conseguira ver pelo reflexo do vidro da vending machine. Pegou Longdon pelo braço e o arrastou em direção às catracas, tentando se misturar à massa. Chegando lá, empurrou o professor catraca adentro e passaram ambos com um só bilhete sem maiores incidentes, embora Longdon tenha ficado ligeiramente contrariado por ter sido ele a passar na frente.

O pequeno guia pegou novamente Longdon pelo braço e o conduziu para dentro da multidão. Estavam quase chegando à escada rolante que os levaria à plataforma de embarque quando ouviram alguém gritando “Ó lá os cara, china!”. Longdon olhou para trás e viu o negão apontando diretamente para eles. Aterrorizado, olhou para baixo e viu o trem parado na plataforma, desembarcando milhares de passageiros. Se pudessem pegá-lo, talvez conseguissem escapar!

Porém, na sua frente, uma multidão preenchia completamente as escadas, tanto a rolante quanto a normal, impedindo a passagem rápida. Se eles seguissem a fila, com certeza não conseguiriam embarcar. Seus perseguidores haviam passado da catraca e se aproximavam cada vez mais. O negão abria caminho no meio da multidão como um tanque. Não parecia haver solução possível. O cérebro de Longdon maquinava furiosamente, mas até o momento, sua melhor idéia tinha sido gritar “Piques!” e encostar na parede. Já estava a ponto de colocá-la em prática quando o homenzinho pegou sua mala, colocou-a no corrimão e pulou em cima, acenando para que ele o seguisse.

Os dois escorregaram corrimão abaixo como se fosse um tobogã e aterrissaram ao lado da lata de lixo. Ainda meio atordoado, Longdon viu que as pessoas na plataforma começavam a entrar no vagão. Olhando para cima, viu que seus perseguidores tinham acabado de chegar no alto da escada e se preparavam para escorregar também. Longdon pegou sua mala e correu atrás do homenzinho em direção ao trem.

Estavam no meio do caminho quando viram as portas começando a se fechar. Atrás deles, um barulho metálico indicava que seus perseguidores já haviam escorregado e derrubado a mesma lata de lixo na aterrissagem. Sentindo uma onda de pânico, Longdon arremessou sua mala em direção à porta, na esperança de travá-la aberta como nos filmes do Jet Li que ele tanto gostava. Contudo, um ligeiro erro de cálculo fez com que ela se esborrachasse no chão do vagão, se abrindo e espalhando suas roupas, livros e objetos pessoais em cima dos outros passageiros.

Os dois entraram no trem logo depois da mala, esbaforidos. As portas estavam quase fechadas e seus perseguidores ainda estavam alguns metros atrás. Longdon estava com o coração na boca, mas exultava. Tinham conseguido! E quando ele pensava finalmente estar em segurança, o negão deu um carrinho em direção à porta e conseguiu travá-la com o pé! Deixando de lado sua dignidade de professor de Harvard, Longdon se agachou e, em um esforço sobre-humano, tentou empurrar aquele Nike Shox tamanho 46 de volta pela fresta da porta.

Foi uma luta hercúlea, Longdon contra o pé do negão. Pela fresta, em meio às gotas de suor que brotavam profusamente em seu rosto, ele viu seu inimigo estendendo a mão para dentro do casaco em busca da arma. A esperança começava a abandonar o pacato professor, quando o homenzinho pegou uma saboneteira do Boston Red Sox que havia caído da mala e a atirou porta afora, acertando a testa do negão. Inspirado por tão certeiro arremesso, que o lembrou de seus gloriosos dias de quinto reserva no Harvard Baseball Team, nosso herói empurrou o agora flácido pé para fora e desabou de costas para a porta, sem fôlego.

Lentamente, o trem começou a acelerar, deixando para trás a estação Tietê do metrô.

domingo, 18 de outubro de 2009

Diário da Lui - 18/10

Hoje, a mamãe veio me dizer que eu ia conhecer a prima Julia, que morava lá no Longe. Achei que a mamãe estava ficando meio doida. Eu conheço a prima Julia que mora lá no Longe desde o dia em que eu nasci! Ela é bochechuda, tem olhos pretos igual às listras do Tigrão, um monte de cabelo e vive sorrindo.

Só que essa era diferente: loira, cabelo curto, olhos cor de mel e muito séria (acho que era porque ela tinha acabado de acordar). Eu tentei avisar a mamãe que aquela não era a prima Julia que mora no Longe - acho que ela não me entendeu, mas tudo bem - até que me explicaram que era outra Julia, de Outro Longe, mas que também era minha prima. Daí eu fiquei pensando: será que existe outra Luiza aqui no Perto? Ou será que tem Outro Perto?

Muito confuso isso.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Agruras da transmissão esportiva no Brasil - III

Ontem ouvi o primeiro tempo dos jogos das Eliminatórias da CONMEBOL pelo rádio. Como no meu carro o AM pega muito mal, as opções eram a CBN, passando Brasil x Venezuela, e a Bandeirantes, com Uruguai x Argentina. Não, a Transamérica não é opção.

Como o jogo de Montevideo era muito mais interessante que o de Campo Grande, comecei na Band. Meu Deus, o narrador parecia operador de telemarketing! Seu bordão é "vai anotando aí, torcedor! A bola vai rolando, a Bandeirantes informando e você vai se ligando!". Pode até não ter erro de português, mas ô coisa feia! Sem falar no comentarista, deprimido e deprimente, que só falava quão ruim era o jogo e como ele não conseguia nem lembrar de alguma chance de gol para algum dos lados - detalhe é que eu cheguei no clube a tempo de ver os melhores momentos do primeiro tempo e vi três chances claras antes dos 20 minutos. Dizem que ginseng e pó de barbatana de tubarão ajudam a melhorar a memória.

Sou do tempo em que as transmissões do rádio eram empolgantes, mais até que as próprias partidas, por isso resolvi dar uma chance ao Brasil x Venezuela. Porém, foi só mudar de canal que peguei o narrador chamando o estádio Morenão de Mineirão. Daí, começou a ler as perguntas no chat da rádio e repassou uma delas à repórter: por que o estádio se chama Morenão? A moça me responde que não sabe, mas vai até perguntar para alguém por ali para ver se descobre. Um show de pró-atividade!

Voltei ao clássico platense bem a tempo de ouvir o narrador anunciando "tempo e placar aqui no Morumbi". Em seguida, o comentarista fala de um lance na zaga argentina e diz que "o corte foi do O-ta-men-di. Otamendi, é isso mesmo!".

Volto à Campo Grande. O narrador está indignado com a não marcação do que parecia ser um penalti claríssimo para o Brasil. Chama a repórter, que compartilha da sua indignação. Chama o comentarista, que está vendo o jogo na TV e diz que o replay mostra claramente que não foi penalti. Mea culpa do narrador? Congratulações ao árbitro pelo acerto? Nada, segue o jogo. Só faltou o narrador dizer "mas bem que ele podia ter dado".

Nas transmissões de jogos pela TV, há o recurso de colocar no mute e só assistir à partida. No rádio, nem isso. Alguma emissora devia transmitir apenas os barulhos do jogo, a torcida, o áudio dos treinadores, etc, para que nós tivéssemos uma opção nessas horas inglórias.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Capítulo 9

Do meio da massa de passageiros, sacolas e guarda-chuvas, dois coreanos e um saco de supermercado foram expelidos de uma van prateada no meio fio da Praça da Sé. Um deles recolheu o saco e o enfiou dentro do casaco, olhando em volta a procura de pedestres curiosos demais. Ninguém notara a faca ou a camisa ensangüentada se projetando do saco plástico. Menos mal. Encaminharam-se para a Estação São Bento do Metrô a passos largos e já estavam quase chegando quando seu celular tocou.

- Alô...sim...baixinho de bigode e gringo alto...mala na mão...vivos? Mais fácil...ok...a Liberdade é nossa.

Fez um sinal para que seu companheiro fosse na frente. Era preciso retransmitir a mensagem antes de entrar no Metrô e perder completamente o sinal. Discou o número, ‘Send’ e aguardou.

- Alô...sim...são dois, um baixinho de bigode e um gringo alto...mas atenção! Todos os acessos devem ser vigiados!

Fechou o telefone e saiu em direção à estação. Isso seria difícil, mais difícil que o cearense no beco sórdido. Teriam que agir com discrição, já que os alvos provavelmente estariam esperando um ataque.

Não tinha medo do americano famoso, mas intimamente torcia para que eles desembarcassem em outra estação. Não gostava da Liberdade, com aquele monte de japoneses em volta. Sentia-se descoberto, óbvio, tão destacado na multidão quanto se estivesse de verde no meio da Gaviões. Felizmente, já era quase nove da noite e os trens não estavam mais tão lotados, mas ainda assim a Liberdade lhe causava calafrios.

Seu companheiro o aguardava ao lado da catraca. Em poucos minutos, estavam amontoados no vagão, chacoalhando no sentido Jabaquara.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Decifrando o mundo

Berço da bebê. Móbile do Winnie the Pooh rodando. Com uma ruga na testa, Lui observa atentamente a dança dos bichinhos. Porco rosa...tigre laranja...urso amarelo...burro cinza...

De repente, heureca! Ela abre um sorriso gigantesco, daqueles que só cabem em uma descoberta histórica, que mude os paradigmas da vida. A descoberta é tão fantástica que não basta sorrir, é preciso também mexer braços e pernas. E chamar alguém para testemunhar, claro.

Sim, fui eu a testemunha. Mas não me perguntem do quê, pois isso ainda é muito avançado para mim.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Capítulo 8

Pegando um caminho alternativo, que incluía algumas dúzias de ruelas e travessas, o Audi A36 seguia paralelo à Marginal Tietê. Nenhum dos dois falara uma palavra nos últimos quinze minutos. A tensão era palpável. O negão ligou o rádio em busca de distração, mas caiu em uma emissora de notícias.

...e o trânsito continua extremamente lento na Marginal do Tietê no sentido Castelo Branco até a Ponte das Bandeiras...

- Acelera essa porra, china, quem sabe a gente ainda pega os caras!

Logo em seguida, o âncora do jornal chamou uma repórter para falar do assassinato brutal do sobrinho do comandante da PM, recém descoberto pela polícia com a ajuda do moto-boy de uma companhia de seguros. O negão ficou lívido enquanto a repórter descrevia as ximbicas destruídas, o cadáver do boyzinho e o carro em que eles agora estavam, dizendo que toda a polícia das Zonas Norte e Leste havia sido mobilizada para encontrar os meliantes em fuga.

- Não podemos mais ficar nesse carro – disse sabiamente o coreano – Vamos parar no Tietê e pegar o metrô.

- Mas e o gringo? – perguntou estupefato o negão.

- Vamos fazer o mesmo que a polícia, honorável colega.

Sacou o celular do boy, discou um número e passou a descrição minuciosa do carro perseguido e de seus passageiros, pedindo que fosse divulgada entre os outros membros do grupo sem demora.

Alguns minutos depois, o coreano entrou no estacionamento do Terminal Rodoviário do Tietê, parando na primeira vaga que encontrou. Os dois desceram do Audi e por pouco não foram atropelados por uma Brasília azul-calcinha que dava ré para sair da vaga de deficiente físico.

Xingando o motorista, o negão e o coreano entraram no Terminal e se dirigiram à bilheteria.

------------------

Durante o restante do trajeto, o homenzinho continuara com seu mutismo enervante, apesar das insistentes perguntas de Longdon. Para onde estamos indo? Quem era o negão que apontou o revólver para ele? Estamos chegando? Por que aquilo ali chama Center Norte? Ou é north ou center, right?

Após mais meia hora enroscados no trânsito, tempo no qual eles consumiram todas as provisões compradas, o Monza finalmente parava na faixa de desembarque do Terminal Rodoviário do Tietê. Longdon hesitou um pouco, mas, vendo que o homenzinho havia desligado o motor, pegou sua mala e desceu. Assim que pôs o pé na calçada, foi prontamente abordado por um garoto de seus 12 anos, esfarrapado e sorridente.

- Deixa que eu carrego, tio!

Mas antes que ele se apoderasse da bagagem do americano, o homenzinho desceu do carro.

- Pode deixar, rapaz, eu levo.

- Então me dá um trocado, tio. Pra ajudar a alimentar minha mãe e meus cinco irmãos menores...
- Tou sem trocado, mas – jogando a chave do Monza para ele – fica com ele pra você...

O garoto olhou para o carro de cima a baixo e fez uma careta.

- Não tem nem uma moedinha mesmo, tio?

Dando de ombros, Longdon e o homenzinho entraram no Terminal e se dirigiram à bilheteria.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Capítulo 7

No bar da cobertura do Edifício Itália, vários executivos se acomodavam nas mesas e no balcão, afrouxando o nó da gravata e se desfazendo do paletó. Era o início do ritual de confraternização que aplacaria os deuses do stress, do mau humor e das preocupações corporativas: o happy hour. Muita gente, muito barulho e uma legião de garçons distribuindo bebidas completavam o panorama, enquanto, ao fundo, uma balada de Eros Ramazzotti tocava discretamente.

No terraço, em uma mesa de frente para o sol poente, degustando um Blue Label e petiscando caviar Beluga, J. P. Alphonsus III assistia ao magnífico entardecer. Mesmo após um dia exaustivo de trabalho, seu terno Armani estava impecável. Do bolso de sua camisa se pronunciava o derrière de uma Mont Blanc e uma gravata de seda italiana fechava o conjunto com maestria. Porém, apesar de ser um exímio jogador de pôquer, seus olhos destoavam da harmonia do pacote e traíam as preocupações que lhe iam na alma.

Assim que os últimos raios alaranjados banharam a Catedral da Sé e as estrelas assumiram seus postos no céu invernal de São Paulo, seu celular vibrou, acusando o recebimento de uma mensagem de texto. Ansioso, ele sacou o aparelho e leu o visor. O avião já pousara e eles foram vistos saindo do aeroporto. Bom. Era hora de conhecer o fabuloso americano solucionador de mistérios e acabar de vez com esse pesadelo.

Com um leve aceno, chamou o maître e o instruiu a pedir seu carro. Tomou um longo gole do uísque e, ao recolocar o copo na mesa, percebeu que sua mão tremia. Estava nervoso, mas não era para menos. Ia conhecer o Sherlock Holmes moderno, o Hercule Poirot do século XXI! Em carne e osso, e sem aquele bigodinho ridículo! Relembrou todos os livros de detetive que devorara quando pequeno e sentiu um arrepio de excitação percorrer sua espinha.

Sorveu mais um gole e esboçou um sorriso. Em uma mesa lá dentro começavam a ensaiar um ‘Parabéns a Você’ quando o maître veio avisar que seu carro estava pronto.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Vitória épica

Antes de mais nada, só para tirar do caminho, o árbitro. Um rapaz novo, que quis mostrar pulso logo no começo do jogo expulsando o Júnior César por reclamação. Até aí tudo bem, ele merecia mesmo - só que não dá para o juiz decidir que já foi rigor o suficiente e, de repente, parar de dar cartão por reclamações acintosas. Ou então ignorar solenemente as duas vezes em que o Carlinhos Bala meteu a mão na bola. Enfim, uma má atuação, mesmo não comprometendo em 'lances capitais'.

Ok, now it´s out of my system. Voltemos a falar do jogo. E que jogo!

O Náutico entrou como o Alonso quando vai quase sem combustível para tentar a pole: mais rápido, mas sabendo que não ia aguentar o jogo inteiro nesse ritmo. Daí, o SPFC providenciou um safety car, dirigido pelo Júnior César. No segundo tempo, o tricolor cresceu, foi para cima e empatou - mesmo o gol tendo nascido de um desvio da zaga pernambucana, era nítido que os paulistas tinham acelerado o ritmo. Daí, veio um stop-and-go, cortesia do Richarlyson, para praticamente sepultar as nossas chances de vitória. Só que o Hugo tinha outras idéias. Jogando com uma vontade rara, o camisa 18 chamou o jogo para si e, antes mesmo do seu (belíssimo) gol, teve duas ótimas oportunidades de desempatar a partida.

Claro que o SPFC tem apresentado vários defeitos e involuções - as mais claras são a queda de rendimento das bolas aéreas (ontem tomamos outro gol em cruzamento e eu nem lembro mais quando foi o nosso último gol de cabeça), o aumento do número de bolas perdidas na defesa e o grande número de cartões evitáveis - mas não dá para negar que o time tem espírito de campeão. Já o Náutico deve ter alguma coisa com (ou contra) o SPFC: todo jogo entre os dois lá nos Aflitos me dá a impressão que o time pernambucano é melhor do que a posição na tabela faz crer. E agora, diferente da rodada passada, o Palmeiras finalmente joga pressionado.

A vitória é uma sensação inebriante. Fiquei até às 0h30 tentando digerir a endorfina para dormir.

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Capítulo 6

Longdon estava estarrecido pela passividade dos nativos frente às adversidades. Estavam presos no trânsito há aproximadamente duas horas e todos os motoristas continuavam em seus carros, como se fosse um acontecimento corriqueiro! Alguns ouviam música, outros abriam jornais, muitos falavam ao celular, uns poucos buzinavam de vez em quando, mas Longdon não viu em ninguém aquela chispa de indignação à la Michael Douglas em ‘Um Dia de Fúria’. Pareciam todos cansados e irritados, mas servilmente conformados com sua sorte.

Enquanto ruminava essas reflexões profundas, nosso herói olhava esporadicamente pelo vidro de trás, procurando um sinal de seus perseguidores. A saída encontrava-se a menos de 300 metros quando um caminhão mudou de faixa e ele viu o possante Audi prateado sete carros atrás na fila deles. Cutucou o homenzinho, mas ele estava ocupado negociando a compra de um pacote de bijus, dois Sulflairs e dois sucos Tampico. Finalmente ele se virou, bem a tempo de ver o Audi entrando atrás de um Uno cinza-chumbo na faixa do meio.

A faixa do Audi estava andando melhor e a distância caíra para apenas 3 carros. O inimigo estava se aproximando, mas, felizmente, a saída estava perto. Só mais 50 metros e estariam livres daquela imensidão de carros! Depois de tanto tempo, eles finalmente iriam engatar a terceira marcha! Só mais 10 metros...5 metros...

Porém, para desespero de Longdon, o Monza nem sequer deu seta para a direita. Ele olhou desolado do imperturbável motorista para a saída escancarada. Como ele podia deixar passar a chance de sair daquele inferno? O homenzinho não disse nada, apenas apontou para o Audi, agora apenas um carro atrás deles. Mas é claro, pensou o professor, clareando as idéias. A rua estaria livre para nós, mas também para nossos perseguidores! Em menos de um minuto eles teriam nos alcançado! Ainda bem que o motorista não havia sucumbido ao efeito idiotizante do trânsito como ele!

No entanto, persistia o perigo de serem alcançados, pois a faixa do meio parecia estar andando muito mais. Para evitar uma maior aproximação, o homenzinho fechou o Uno cinza-chumbo, que só conseguiu evitar a colisão por estar a menos de 10Km/H. O Audi contra-atacou pulando para a faixa da direita, que começara a andar. Não havia mais nenhum carro entre eles e, subitamente, a luz de freio do carro na frente do Monza acendeu. Longdon olhou para o lado e viu que o negão havia sacado seu revólver.

---------------------------

- Acabou a brincadeira, porra! – gritou o negão.

Já estava estendendo o braço para fora, com o revólver apontado para o gringo, quando uma sirene estridente se fez ouvir ao longe. Uma veraneio preta da ROTA vinha em desabalada carreira, com um policial empunhando uma metralhadora na janela. Os carros amedrontados iam abrindo caminho como podiam em meio ao trânsito estacionado e em pouco tempo, uma nova faixa brotou milagrosamente na frente dos representantes da lei e da ordem. Assim que viu a viatura no retrovisor, o negão recolheu a arma assustado.

- Ai, caralho! Lá vem os homi e eu aqui nesse carrão! Você e suas idéias de girico, china! Agora pula pra cá, quem vai segurar o rojão é você!

O coreano trocou de lugar com o negão – não sem dificuldade, já que o Audi era um modelo esportivo – e, rapidamente, pegou a saída à direita, acelerando pela rua esburacada. Ao fundo, a sirene foi ficando cada vez mais distante até que foi completamente afogada pelos ruídos do trânsito. Haviam perdido contato com a presa, mas no momento o mais importante era evitar as autoridades.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Capítulo 5

O centro de São Paulo na hora do rush produz uma singular mistura de odores, visões e ruídos. Há carros que fecham cruzamentos e são brindados por outros carros com uma orquestra atordoante de buzinas. Há milhares de pessoas que se deslocam de seus trabalhos para a escola ou para casa sem ao menos olhar para o lado. Há vendedores ambulantes que tentam chamar a atenção dos passantes para suas mídias e óculos piratas. Há funcionários zelosos de toda espécie de estabelecimento comercial que despejam os sacos de lixo do patrão em pleno meio-fio. Há barraquinhas de churrasco circundadas de pequenas multidões, enquanto, em algum lugar, um miado angustiado chora a perda de um ente querido. Há travestis e prostitutas que saem mais cedo em busca dos clientes mais ávidos, madrugadores ou incontinentes. E toda essa cacofonia ainda é cortada de tempos em tempos por alguma sirene estridente, que deixa a respiração suspensa por um segundo e some sem deixar rastros. Talvez por isso ninguém tenha notado o beco sórdido ao lado de uma padoca, onde dois coreanos discutem enquanto arrastam um corpo para trás de uma lixeira.

- Porque você enfiou a faca aí? Agora a camisa tem um furo! E tá toda manchada de sangue! Por que não torceu o pescoço dele?

- Agora não adianta discutir! Além disso, a gente não tem muito tempo e olha o tamanho dessa cabeça! Ia demorar uns três dias pra torcer até o fim!

- Tá, deixa pra lá...vamos dar o fora rápido!

- Mas será que ninguém vai notar um cadáver de um cearense pelado aqui? Não é melhor esconder?

- Onde?

- Ali, entre o mendigo que morreu de frio e o drogado que morreu de overdose.

Os dois unem esforços para arrastar o mirrado corpo até o fundo do beco e despejam-no no meio dos outros corpos. Rapidamente, deixam-no apenas de cueca, levando suas roupas, seu rolex falseta, seus passes de ônibus e seu crachá.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Capítulo 4

Ajoelhado sobre o banco, agarrado na fitinha do Senhor do Bonfim e balbuciando algo que mais parecia uma prece para Xangô, Longdon assistiu estarrecido à manobra espetacular de seu pequeno motorista. O homenzinho havia desviado do Audi no último instante, aproveitando a brecha na frente de um caminhão-tanque da Petrobrás que demorou para acelerar e já ligava a seta para entrar na pista local. Unbelievable! Seus amigos de Harvard nunca acreditariam se ele contasse!

Alheio aos devaneios de seu passageiro, o homenzinho seguia à velocidade máxima pela via de acesso à pista local da Marginal Tietê – o que equivalia a 70 Km/H. À sua frente, a pista local apresentava um panorama parecido com o da pista expressa, mais adequado a um estacionamento do que a uma rodovia.

A fila da esquerda andou e ele embicou o carro antes de um velhinho meio cego em um Palio verde. Andou mais alguns metros e o Monza foi tragado pelo tráfego congestionado. Não havia mais saída possível pelos próximos 500 metros e, pelo andar da carruagem, levaria mais ou menos uma hora para percorrer essa distância.

--------------------

Um pouco atrás, o Escort e a Caravan protagonizavam um engavetamento de cinema, com perda total para as duas ximbicas. Curiosamente, apenas trincou a lanterna esquerda do Audi, embora a reação do seu dono sugerisse um dano muito maior. O boyzinho chutava e esmurrava o que havia sobrado do Escort quando um coreano saiu da Caravan. Com toda calma do mundo, sacou uma pistola, colocou o silenciador e deu um tiro certeiro no meio da testa do rapaz.

Assim que ele caiu, um negão de 2 metros de altura saiu do Escort com cara de assustado. Olhou em volta, viu que ninguém dava a mínima para o corpo estendido no chão e desanuviou o semblante.

- China do caralho, precisava ficar meia hora pondo o silenciador? Você só me fode, mesmo!

Enquanto o negão trocava o pneu do Audi, o oriental caminhou serenamente até o cadáver e extraiu as chaves do carro do bolso do boy. Viu que o celular do cara era um Nokia último modelo, com bluetooth, câmera, GPS e escova de dentes embutida e o recolheu também. Já se encaminhava para o banco do motorista quando o negão arrancou a chave da sua mão dizendo:

- Quem dirige sou eu! Você já fez muita merda hoje.

- Mas você também bateu sua ximbica, honorável colega.

- É, mas você bateu atrás. Nunca ouviu que quem bate atrás é sempre culpado?

Não tendo como discutir essa insofismável verdade milenar e vendo que a CET se aproximava do local do sinistro, o coreano se acomodou no banco do passageiro mesmo. Deu sorte, pois no porta-luvas encontrou um iPod de 800Gb de memória com visor de titânio cromado e fones sem fio, que embolsou prontamente.

O Audi saiu cantando o pneu, despertando a inveja de dez a cada dez motoristas ao redor.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Capítulo 3

Dentro de um quarto fétido de uma pensão meia-estrela no centro da cidade, uma forma se remexia sofregamente em cima do colchão ralo e cheio de pulgas. Subitamente, o alarme do despertador cortou o silêncio daquela tarde de quarta-feira, só para ser abafado pelo grito de terror típico do despertar no meio de um pesadelo terrível. Com o suor escorrendo pela face, a forma desligou o alarme e sentou-se na beirada da cama para recompor os pensamentos.

Tivera o mesmo pesadelo de sempre. Estava no mesmo corredor estreito, usando o mesmo uniforme de segurança, com o mesmo pavor no coração de todas as noites, quando de repente uma avalanche de pessoas veio em sua direção. Ele já esperava, mas nem por isso o terror era menor. Era mais gente do que ele sabia contar – matemática nunca fora o seu forte – mas não era preciso ser nenhum Einstein para perceber que era mais gente do que caberia naquele corredor. Ele se virara para fugir, mas fora engolfado e arrastado pela multidão corredor afora. Já estava ficando sem ar, esticando a mão por sobre aquele mar humano em busca de uma tábua de salvação quando, finalmente, o relógio o despertou.

Tinha se cansado daquela vida, de não conseguir dormir direito à noite, de acordar quase sufocado, banhado em suor e com um grito entalado na garganta. As duas pensões anteriores em que ele se arrumara o tinham posto na rua depois da segunda madrugada de gritos apavorantes.

Felizmente, conseguira trocar seu posto de segurança diurno pelo de vigia noturno. Ainda tinha o pesadelo, mas com menos freqüência e cada vez vinha menos gente para afogá-lo no corredor estreito. É, apesar do risco e da confusão de dormir de dia para trabalhar à noite, tinha feito um bom negócio.

Depois de se aprontar, saiu para tomar o desjejum. Uma das coisas mais complicadas tinha sido adequar a alimentação ao seu novo horário. No primeiro dia, atacou um PF na padaria perto da pensão, mas seu estômago não se deu bem com o ovo frito e o bife sola-de-sapato logo ao acordar. Resolveu então fingir que o dia continuava igual, mesmo que estivesse escuro no café da manhã e amanhecendo no jantar. Sua referência seria sempre a hora de acordar. Agora, chegava na padoca às 20hs e já tinha um pingado e um pão na chapa esperando por ele no balcão. E quando saía do serviço, às 6 da manhã, encarava um ovo cozido e umas coxinhas com o guaraná Convenção. Sentia falta do arroz, feijão e farinha diário, mas não se pode ter tudo na vida. Todo dia, a mesma padoca. Todo dia, o mesmo banco no balcão. Todo dia, a mesma tia atendendo. Definitivamente, a vida vinha melhorando.

Estava no semáforo ao lado da padoca quando foi agarrado por dois homens e arrastado para um beco sórdido. Antes que pudesse esboçar qualquer reação, sentiu o metal gelado penetrando entre suas costelas e desmaiou, sem nem ao menos entender por que fora esfaqueado.

Imagina se fosse no Brasil

Na Allsvenskan, a 1ª divisão sueca de futebol profissional, o goleiro do IFK Gotemburgo - um dos candidatos ao título desse ano - foi flagrado diminuindo a largura do gol durante os jogos do campeonato ao empurrar as traves para dentro 10 cm de cada lado (veja aqui). O juiz simplesmente empurrou as traves para a posição correta novamente e mandou o jogo seguir. Entrevistado no intervalo, ele confessou ter feito isso várias vezes antes e que nunca havia sido descoberto. Seus companheiros de time não só sabiam da armação, como também faziam o oposto com o gol dos adversários para aumentá-lo. Detalhe: faltam seis rodadas para o fim do campeonato e o IFK está empatado em pontos na liderança com o AIK, liderando no saldo de gols.

Depois brasileiro é que é malandro, desonesto e gosta de levar vantagem em tudo.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Capítulo 2

Em Cumbica, depois de duas horas para passar pela alfândega por causa da greve da Polícia Federal, Rupert Longdon encontrou seu contato no saguão do aeroporto. Era um homem baixo, usando um bigode com cara de falso e segurando uma plaquinha onde se lia Rupert Longdong. Só faltava essa, meu empregador é um piadista, pensou. Bom, podia ser pior, se fosse algo do tipo...well, actually, não tinha como ser pior.

Sem qualquer saudação, o caricatural homenzinho conduziu-o até um Monza 89. Vendo o nariz torcido de seu passageiro, garantiu que o uso desse carro em particular era imprescindível por razões legais – e não mentia, já que era dia do rodízio do seu carro e aquele era o da sogra que ele tinha pego emprestado.

Percorreram lépidos a Ayrton Senna, porém, ao chegar à Marginal Tietê, o trânsito da hora do rush de São Paulo atingiu-os como uma bofetada. O ar estava quente e abafado e o zumbido dos motoboys passando a alguns milímetros do espelhinho era praticamente ininterrupto. Sentindo os ovos e a salada de repolho da comida do avião se encontrarem no seu estômago, Longdon tentou sondar o motorista sobre detalhes do caso. O homenzinho não era lá muito expansivo, mas disse que as instruções viriam diretamente do chefe na hora oportuna. Para gastar o tempo, nosso herói passou a examinar os detalhes do veículo. Notou que pendurado no espelhinho havia uma fita do Nosso Senhor do Bonfim e tentou puxar papo com o hermético motorista.

- Bahia, hein? I´ve been there...belas cidades, lindas mulheres...muita música, sol forte, praia...diz aí, por que diabos você saiu daquele paraíso pra vir pra essa metrópole fedida?

O homenzinho não saiu do seu mutismo e continuou olhando fixamente para a Caravan laranja com vidros 150% filmados na sua frente.

Rupert Longdon hesitou por uns minutos, mas retornou à carga.

- Wait, don´t tell me...essa fitinha é presente de alguém que foi à Bahia e trouxe pra você, né? Você sabia que essa mistura do catolicismo com o candomblé é um símbolo do atraso cultural em que vocês vivem? E olha que de símbolo eu entendo!

Os olhos do homenzinho se desviaram rapidamente para o espelho. Um Escort XR3 amarelo rebaixado reduzia a velocidade atrás deles. Longdon entendeu o movimento das pupilas como uma reação negativa e tentou uma cartada final.

- Já sei! Você é...é...what´s it called? Chicleteiro! Essa foi a única lembrança do carnaval na Bahia que você conseguiu comprar depois de passar seis noites tomando vodka com Fanta Uva e tentando trocar uma noite de amor com você por um...um...what´s that word again? Oh, yes...abadá!

De repente, o Monza saiu cantando pneu e enveredou pelo acostamento, com a Caravan e o Escort em sua caça. Longdon, que não tinha notado os perseguidores, continuava com suas suposições sobre as raízes da fitinha, misturando Jorge Amado, ACM e Vampeta numa teoria ininteligível de fazer inveja a Caetano Veloso. Ou não. Só quando o Escort bateu no pára-choque do Monza é que ele se tocou do que acontecia.

Cem metros à frente, um Audi A36 prata rebaixado, com banco de couro e rodas de liga leve estava parado no acostamento com um pneu furado. Seu dono, que depois de chamar a seguradora usava o celular para passar trotes para Honduras, só percebeu a perigosa aproximação quando havia pouco a se fazer. Instintivamente, protegeu com a mão os olhos para não ver a porrada, mas não conseguiu evitar ouvir a explosão.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Capítulo 1

Eram 3 horas da manhã em Boston, Massachussets. Rupert Longdon, professor de simbologia e iconografia da Universidade de Harvard, dormia, roncava e babava no travesseiro em seu apartamento. Sonhava com sua última aventura estapafúrdia na Europa, cheia de reviravoltas surpreendentes, onde tivera que seguir pistas deixadas alguns séculos atrás, desvendar mistérios dos maiores gênios da humanidade e frustrar os planos de uma organização extinta. Mais do que isso, sonhava com a doce Sofia, quando a campainha estridente do telefone o arrancou violentamente dos braços de Morfeu.

Do outro lado da linha, uma voz gutural tentava se comunicar num inglês macarrônico com sotaque paulista. Suspirando profundamente e agradecendo aos céus por ser fluente em português, assim como em alemão, francês, italiano, latim, javanês e fenício, Longdon disse:

- I’m sorry, sir, mas aqui não é do consulado brasileiro!

- Mr. Longdon, não desligue! – insiste o inoportuno interlocutor – Tenho certeza que o senhor irá se interessar pelas notícias que eu trago.

Humm...o interlocutor o conhecia. Era preciso ganhar tempo.

- Você vai dizer que a Gisele Bündchen quer me conhecer?

- Não, mas...

- Que vou ser homenageado no desfile da Mangueira desse ano?

- Acho que não...

- Que o São Paulo Futebol Clube vai me contratar pra ser centroavante?

- Nã...

- Então você não tem nenhuma informação que me interesse.

- Mr. Longdon, você não entende, nós vamos estar precisando urgentemente da sua presença para estarmos resolvendo esse mistério...

- Que mistério? Tou com a agenda lotada, meu amigo. Não posso perder tempo com misteriozinho de terceiro mundo...

- Mas esse é dos bons! Tem implicações políticas, ideológicas, econômicas e futebolísticas! Quando resolvê-lo, o senhor alcançará a glória imorredoura!

- Ainda não me convenceu. Faz de conta que eu quero mudar de operadora. Como você vai me fazer ficar?

Alguns minutos de tensa negociação depois, Rupert Longdon aceitou viajar ao Brasil sem compromisso. Se aceitasse colaborar, receberia U$1 milhão de luvas, mais U$250 mil de direito de imagem, vale refeição e celular da empresa. Além disso, caso o mistério fosse solucionado a contento, teria direito a 10% de quaisquer propinas envolvidas e uma entrada VIP-ANUAL para o Café Photo. Assim, pegou sua mala, seu Guia 4 Rodas de 1994, seu passaporte e se encaminhou ao Aeroporto Internacional de Logan.

domingo, 20 de setembro de 2009

Rodada especial

São-paulinos e palmeirenses vibrando com gols do Roger, são-paulinos torcendo pelo Kléber Gladiador e palmeirenses pelo Marcelinho Carioca. Tem coisas que só o Brasileirão de pontos corridos pode proporcionar.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Prólogo

Ladeira Porto Geral.

4h28

Alheia ao agito da vida noturna do centro da cidade, a região da rua 25 de Março ressona tranquilamente, curtindo o sossego do final da madrugada. O único movimento visível vem de trás de uma caçamba, onde um gato vadio se espreguiça languidamente e sai à caça da sua refeição da madrugada.

Sob a tênue iluminação dos postes, dois boêmios surgem cambaleando dos lados da Praça da Sé. Aparentando um teor alcoólico considerável, os companheiros percorrem um breve trecho da 25 entre tropeções e risadas, parando ao lado de um poste no sopé da Ladeira Porto Geral. Pressentindo o perigo, o intrépido felino desiste de sua empreitada e busca refúgio no beco mais próximo.

Conduzido por seu colega, o mais alto dos boêmios se senta na soleira de uma loja. Em seu rosto, um esgar, misto de dor e medo. Lentamente, como se lutasse contra o sono, recosta a cabeça no batente da porta e fecha os olhos.

-----------------------------

8h23

Seu Geraldo chega à Ladeira Porto Geral para abrir sua loja de fantasias e encontra um bêbado encostado na porta.

- Mas que porre, hein, amigo? Não acordou nem com as marteladas dos barraqueiros aí da frente?

O bêbado continua lá, apagado.

- Bom, agora tá na hora de levantar que eu tenho que abrir minha loja.

E o bêbado quieto igual morto. Seu Geraldo dá uma cutucada no ombro dele.

- Moço! Sai daí que eu preciso trabalhar!

A situação já começa a chamar a atenção dos passantes. Seu Geraldo sacode o bêbado, que cai para frente e revela uma faca enterrada até o cabo em suas costas.

A cena que se segue parece um borrão na memória do Seu Geraldo. Ele lembra de uma mulher gritando, das sirenes da polícia e da multidão em volta da loja, mas quase nenhum detalhe.
A perícia determinou que a morte se deu entre 4 e 5 da manhã. Na entrevista para o jornal, o detetive disse que o crime tinha sido minuciosamente planejado e bem executado. Nenhuma câmera de segurança na região, nenhuma testemunha, nenhuma pista do culpado. Nos bares da região, ninguém reconheceu a foto do morto. Quando o crime foi descoberto, o assassino já estava bem longe dali.

O Código da Vinte

Uns anos atrás eu comecei uma sátira do livro do Dan Brown ambientada em São Paulo, mais especificamente na região da Rua 25 de Março. Até agora, a história já tem 15 capítulos, mas ainda falta muito chão para que Rupert Longdon consiga decifrar o mistério.

Vou publicar o que já escrevi aqui, em formato de folhetim, um capítulo por semana. Ou talvez antes.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Como queríamos demonstrar

Lembra dos tipos de goleiros? E da pegada? Pois não é que o Marcos teve seu dia de azar, tomou um gol de pinball e comprovou ambas as teorias?

Evidência 1: um domingo de sol em Salvador, quando uma falta na intermediária é alçada na pequena área do Palmeiras. Marcos tenta socá-la para longe, mas a bola bate no jogador do Vitória e entra no gol alviverde.
Evidência 2: Manual do Goleiro, onde consta que, em CNTP, só deve ser socada a bola que estiver fora do alcance de uma defesa segura. Segundo ele, o soco também é aceitável em jogos com muita chuva ou quando o goleiro não estiver seguro com a sua pegada.
Evidência 3: a cara de nádega do Marcos após a conclusão do lance.

Conclusão: o Marcos, por ser um goleiro instintivo, faz as defesas de acordo com seu feeling. Claro que o santo verde sabe e treina as defesas 'corretas' - por exemplo, não socar ou rebater uma bola para o meio da área - mas quando a porca torce o rabo, ele deixa que a Força conduza seus movimentos. Com a campanha subliminar sórdida de desvalorização a que a pegada vem sendo submetida (muito pela falta de conhecimento específico sobre goleiros dos comentaristas e formadores de opinião), a Força, que se assusta fácil, acaba optando por jogar a bola para longe o mais rápido possível ao invés de tentar segurá-la para armar um contra-ataque.

CQD.

---------------------------------

Não é sempre que um time consegue três vitórias na mesma rodada do Brasileirão. Esse é um fim de semana para o São Paulo comemorar bastante.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Lama na pista

As graves acusações de Nelson Piquet Jr. conseguiram sujar ainda mais a reputação da Fórmula 1, que já não prima exatamente pela ética e a esportividade. Só para ficar nos exemplos mais emblemáticos: lembro do Prost tirando o Senna da pista para ser campeão, da FIA tirando o título do Senna depois dele ganhar a corrida após ser tirado da pista pelo Prost, do Senna tirando o Prost da pista para ser campeão, do Schumacher tirando o Hill da pista para ser campeão, do Rubinho abrindo para o Schumacher passar e da espionagem da McLaren em cima da Ferrari. Aliás, comum esse negócio de tirar o outro da pista para ser campeão, não?

Alguns comentários avulsos sobre essa história:
- O Nelsinho pode dizer que foi pressionado, que estava com a cabeça frágil, mas denunciar depois de aceitar ser cúmplice me parece de um oportunismo à la Roberto Jefferson.
- A FIA garantiu imunidade ao piloto por ter aberto o jogo. Alguém aí falou em delação premiada?
- Há alguma prova além do dossiê bombástico que ele entregou à FIA? Se não, fica parecendo mesmo que ele arquitetou toda a manobra e depois tentou chantagear a Renault.

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Janela de Transferências

A Walt Disney Co. fez a grande aquisição dessa janela de transferências, reforçando seu já estelar elenco com os mais de 5.000 personagens da Marvel. A imprensa especializada tem especulado bastante sobre o destino do CT da rival Universal Studios, o Islands of Adventure Marvel Heroes, onde se apresentavam algumas das principais estrelas da companhia, mas até agora não houve nenhum comunicado oficial sobre o assunto. A torcida do time de Orlando aguarda apreensiva a estréia dos reforços para ver como vai ser a adaptação de jogadores do calibre de Homem-Aranha, Hulk, Homem-de-Ferro e Wolverine sob a liderança daquele que é seu franchise player, Mickey Mouse.

Das agências internacionais.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Agruras da transmissão esportiva no Brasil - II

Armando Nogueira diz que quando iniciou a carreira, o jornalista esportivo era a ralé, relegado ao plano da insignificância. De lá para cá, muita coisa mudou, mas parece que cresceu o número de seus colegas fazendo justiça ao conceito, principalmente nos veículos especializados de massa.

Ontem, uma manchete no UOL dizia que Rogério Ceni estava cobrando da população protestos contra o Senado. Futebol entrar no mérito da política é raro no Brasil - embora o contrário seja mais comum do que o bom senso aconselharia - então fui lá ler as tais declarações conclamatórias. Pena que não havia nenhuma (see for yourself).

Apesar da reportagem dizer com todas as letras que o Rogério "pediu para que a população se revolte perante os escândalos que assolam o Senado, e não contra o futebol", tudo o que encontrei lá foi uma crítica à inversão de valores da sociedade. O Rogério, ao falar sobre a invasão do vestiário da Portuguesa por pessoas armadas, lamentou o fato das pessoas se importarem muito mais com o mau desempenho do time (que é ineficiência) do que com a má gestão da máquina pública (que é crime). Porém, "Rogério cobra protestos contra o Senado" gera muito mais repercussão que "Rogério recrimina inversão de valores na sociedade".

Hoje de manhã, recebi no farol o jornalzinho da Placar ao invés do Metro ou do Destak. Ótimo, afinal eu só lia as manchetes e a página de esportes dos outros dois mesmo! Anyway, achei que ia ser algo como o Lance! - tendencioso, populista, mas com alguma informação que se salve. Outro engano.

Na capa, além de uma matéria sobre a volta do Muricy ao Morumbi questionando se ele é herói ou traíra, tem chamadas para uma entrevista do Amoroso ("Amoroso ataca Rogério Ceni"), para uma matéria sobre o Fórmula 1 ("Estatístico inglês prova que vitórias do Barrichello são melhores que as do Senna") e para um artigo sobre visagismo ("Visual errado faz craque jogar mal").

Pois bem, na entrevista o Amoroso fala sobre vários assuntos, todos polêmicos, e comenta que ficou chateado pelo Rogério Ceni não ter usado sua influência para que ele ficasse no SPFC - sou só eu ou 'ataca' é meio forte para o caso? Sem falar que a entrevista teve 5 perguntas, cada uma sobre um tópico diferente, mas a chamada era só para um adendo a uma das respostas.

A da Fórmula 1 é um pouco pior: um estatístico inglês, a pedido da Placar, fez uma contagem do número de ultrapassagens que cada piloto brasileiro fez nas suas 10 primeiras vitórias. O Senna só fez 4 e o Rubinho fez 15. Ok, e daí? Desde quando número de ultrapassagens é critério de qualidade? Uma vitória de ponta a ponta é pior que uma saindo em 3º? Depois ainda vem um comentário do Flávio Gomes dizendo que isso é besteira, que os tempos eram outros, que não havia reabastecimento, que o Barrichello ultrapassou 13 vezes em duas corridas atípicas onde quase todo mundo quebrou e que isso só mostra que o tipo de pilotagem mudou com os anos. Ou seja, a reportagem conclui que não diz nada de útil. E mesmo assim quem publicou colocou como manchete "Melhor do que Senna".

Por fim, o visagismo - segundo a própria reportagem, "a arte de descobrir o que uma pessoa deseja expressar e criar para ela uma imagem pessoal que revele essa intenção". Deseja expressar e revele essa intenção são os termos chaves aqui - ou seja, é uma técnica para melhorar a imagem e o marketing pessoal. Quer dizer, segundo ela, se o Ronaldinho Gaúcho cortar o cabelo e tirar a faixa da cabeça, não só vai passar a imagem de menos avoado como também vai acertar mais passes, participar mais do jogo e fazer mais gols. Quem sabe eu não fico mais inteligente se colocar óculos! Sério, se eu tivesse pago por isso, teria ficado muito bravo!

O futebol nacional tem uma série enorme de problemas e um deles é a má qualidade da imprensa especializada, com raras e honrosas exceções. Seria interessante para as próprias exceções separar esse produto - misto de programa sensacionalista, conto-do-vigário e panfletagem - do verdadeiro jornalismo, onde quem dá a notícia não vende pageviews ou pontos no IBOPE e sim sua credibilidade.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

PA de razão 1

Uma combinação de resultados na próxima rodada do Brasileirão pode criar uma seqüência curiosa na tabela. Caso:

- o São Paulo ganhe do Palmeiras no Morumbi (possível)
- o Santos do Fluminense na Vila (provável)
- Corinthians e Barueri não empatem (2/3 de chance)
- o Avaí ganhe do Coritiba fora (quem ousa duvidar dos caras?)
- o Inter vença o Goiás no Beira-rio (provável)
- o Flamengo vença o Santo André no Maracanã (seria provável, mas eu também não ouso duvidar do Flamengo)
- Vitória e Cruzeiro empatem em Salvador (1/3 de chance)
- o Náutico vença o Atlético-PR em Recife (provável)
- o Sport vença o Atlético-MG em Minas (difícil)
- e o Grêmio vença o Botafogo no Engenhão (quase impossível)

teremos uma escada de pontos entre o 1º e o 14º colocado com degraus de 1 ponto. Ficaria Palmeiras com 40, SPFC com 39, Goiás com 38, etc, até Vitória com 29, Cruzeiro com 28 e Atlético-PR com 27.

Tenho certeza que esses alinhamentos cósmicos reservam surpresas interessantes.

------------------------------

Atualização em 27/08

Esqueçam a escadinha. Além da sabotagem de Barueri e Corinthians, tinha esquecido dos jogos atrasados de Inter, Santos, Cruzeiro e Botafogo. Ou seja, não será dessa vez que seremos testemunhas de algum fenômeno futebolístico-metafísico.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Revendo os prognósticos

Passada a 19ª rodada do Brasileirão, está na hora da primeira revisão das avaliações feitas no começo do dito cujo. Vejamos qual é o aproveitamento do palpiteiro so far - lembrando que a única certeza que temos no momento é que tudo pode mudar.

-------------------------

LEGENDA:
Rebaixamento - entre o 17º e 20º lugar
Limbo - entre o 12º e o 16º lugar
Sul-americana - entre o 5º e o 11º lugar
Libertadores - entre o 2º e o 4º lugar
Título - 1º lugar
Em itálico - chute inicial
Em itálico e negrito - placar dos chutes

Atlético/MG - toda vez fico na expectativa do Tardelli estourar, mas acho que Sul-americana tá de bom tamanho.
Pode-se até dizer que o Tardelli estourou e o time liderou boa parte do turno. Mesmo assim, tá difícil levar o Galo a sério na briga pelo título. Acho que subiu um degrau e deve lutar pela Libertadores. 1 alterado.

Atlético/PR - se ano passado foi a vez da do Eurico, esse ano é a herança maldita do Petraglia que vai se manifestar. Rebaixamento.
Olha que ainda é possível. O time vem se recuperando calcado na boa fase do Paulo Baier - algo que o Goiás de 2007 também fez e só não caiu por causa do Corinthians. 1 alterado e 1 mantido.

Avaí - não é aqui...surfe...Guga...ok, na quarta coisa que veio à mente, chegamos ao futebol: importou um meio-campista para a Coléia pra jogar com meu irmão. Não que impacte na campanha deles, que deve ficar no Limbo.
Surpreendente. Podemos estar testemunhando o nascimento de um grande técnico. Agora, acho que leva a Sul-americana sem esforço. 2 alterados e 1 mantido.

Barueri - inovar é uma coisa, inventar moda é outra completamente diferente. Três caras tomando conta de algo dá besteira desde os idos de março, com Julio César, Marco Antônio e Otávio. Rebaixamento.
Eis o time exceção para confirmar todas as regras. Atrasa salários, trocou 3 treinadores (e foi trocado por 1), vendeu seu jogador símbolo para as arábias e mesmo assim, continua brigando pelas cabeças. Acho que logo, logo a sorte muda e ele briga para ficar no Limbo. 3 alterados e 1 mantido.

Botafogo - tem mais time e mais técnico que no ano passado, mas não dá a impressão de que vai melhorar o desempenho. Sul-americana.
Não tem mais técnico anymore e o time, que no papel é razoável, vem refugando sistematicamente. Forte candidato ao Rebaixamento. 4 alterados e 1 mantido.

Corinthians - torço pelo Ronaldo tanto quanto torço contra Chicão, Felipe, Cristian e Mano. Queria que o Fenômeno fosse o artilheiro do campeonato e só, mas acho que briga pelo Título. Ronaldo mais ficou fora do que jogou até agora e a diretoria promoveu um yard sale de meio de temporada digno dos Perrela. Apesar disso, o time continua forte (Elias está muito acima da média, a zaga é boa e Dentinho também) e ainda acho que incomoda na briga pelo Título - até porque é a única coisa que ainda o motiva esse ano. 4 alterados e 2 mantidos.

Coritiba - impressionante na Copa do Brasil, nem parece que perdeu a referência no ataque. Dá até pra pensar em Libertadores.
Entrou em crise após a eliminação da Copa do Brasil e comprometeu o início do Brasileirão. Tem um bom time, mas já trocou de técnico e está brigado com a torcida. Acho que se estabiliza logo mais e fica no Limbo sem maiores sustos. 5 alterados e 2 mantidos.

Cruzeiro - medo. A cada ano que passa o time melhora. Título.
Ficou irreconhecível após perder a Libertadores, mesmo ainda tendo um time forte após as tradicionais vendas de meio do ano. Fica mais difícil ter medo de um time que contrata 4 laterais esquerdos medalhões e efetiva na posição um garoto vindo dos juniores - que vem jogando muito bem, diga-se de passagem. Sul-americana. 6 alterados e 2 mantidos.

Flamengo - eu acredito no Adriano. Não, em duendes não. Libertadores.
Eu ainda acredito no Adriano, assim como o Dunga. Briga pela Libertadores. 6 alterados e 3 mantidos.

Fluminense - no papel, é forte (Conca e Fred!), mas o papel só joga na semi da Copa da UEFA. Sul-americana.
Conca tem jogado menos que bolinha de papel e Fred machucou - não que estivesse bem antes disso. Além disso, touxe de volta Renato Gaúcho, que pode conseguir um pouco invejável bi-Rebaixamento. 7 alterados e 3 mantidos.

Goiás - o Iarley é ótimo, mas acho que o resto não acompanha. Terá sorte se ficar no Limbo.
Não só o resto vem acompanhando muito bem como o clube ainda repatriou o cobiçado Fernandão, bem nas barbas de Palmeiras, São Paulo e Inter. Porém, sua campanha em casa não inspira muita confiança e creio que na reta final vai se contentar com a Sul-americana. 8 alterados e 3 mantidos.

Grêmio - o Souza tá jogando tanto que nem lembrava que o Tcheco ainda está lá. Título.
O time continua bom, mas o bloqueio psicológico fora de casa impossibilita qualquer grande aspiração. Sul-americana. 9 alterados e 3 mantidos.

Internacional - o melhor time do país pelo 3º ano seguido. Porém, acho que dessa vez vai brigar pelo Título.
Ainda deve brigar pelo Título, mas parece que perdeu a inspiração. Não é mais o favorito. 9 alterados e 4 mantidos.

Náutico - passou raspando too many years. Esse é o ano deles. Rebaixamento.
Apesar da interessante teoria do André Kfouri, de que o time não cai pelo know-how da situação, continuo achando que esse é o ano deles. Rebaixamento. 9 alterados e 5 mantidos.

Palmeiras - ataque ganha jogo, defesa ganha campeonato. No máximo, briga pela Libertadores.
Trocou Keirrison por Obina, mandou Luxemburgo embora e, depois de uma minissérie, trouxe Muricy. Enquanto isso, o time chegou à liderança e abriu vantagem, sagrando-se campeão do 1º turno. Acredito que o ritmo vai cair um pouco e o time acaba brigando pela Libertadores. 9 alterados e 6 mantidos.

Santo André - uns 5 anos de atraso. Em 2004 um time com Gustavo Nery, Marcelinho Carioca e Rodrigo Fabri seria favorito ao título. Rebaixamento.
Ainda mandou embora o Sergio Soares, um dos únicos profissionais promissores do time. Rebaixamento mesmo. 9 alterados e 7 mantidos.

Santos - time bom e técnico inovador. Só duvido que a torcida tenha a paciência necessária. Deve ficar na Sul-americana.
Nem a torcida, nem o presidente tiveram paciência - e olha que o técnico nem se mostrou tão inovador assim. Ainda tem um time bom e corre o risco do Luxemburgo tirar alguma coisa da cartola, mas não deve passar da Sul-americana. 9 alterados e 8 mantidos.

São Paulo - tríplice coroa, a de verdade, com título nacional, continental e mundial. Espero nada menos que o Título, fora o baile.
Não deu para tentar a tríplice coroa e a era Muricy terminou com o time beirando a zona de rebaixamento. Para piorar, contratou-se o Ricardo Gomes, que não tem um currículo muito animador. Mas não é que deu certo? Ainda acho que a diretoria 'diferenciada' acerta mais por sorte que por planejamento, mas o time voltou a ser forte candidato ao Título. Inclusive o mais forte, na minha humilde e isenta opinião. 9 alterados e 9 mantidos.

Sport Recife - a Bombonilha não é mais aquela. Sul-americana.
Nem a Bombonilha, nem os antes ótimos Magrão, Durval, Dutra, Ciro e um longo etc. Nunca uma Libertadores fez tanto mal a um time. Rebaixamento. 10 alterados e 9 mantidos.

Vitória - Carpegiani não dá confiança. Limbo.
Eis um caso de errar acertando: no 1º Turno, o Carpegiani foi principal o responsável por levar o Vitória à briga pela liderança, muito acima do que poderia se esperar. Daí, o time perde uma seqüência de pontos normal para um time do limbo e a diretoria megalomaníaca manda o cara embora. Resumindo, se o Carpegiani continuasse lá, eu mudaria o palpite. Como ele caiu, cravo no Limbo. 10 alterados e 10 mantidos.

-------------------------

Até agora, o Told you so index mostra impressionantes 50% de acerto. A próxima revisão será depois da última rodada.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Pegada

A Pegada é a principal ferramenta de trabalho de um goleiro. Seja para uma defesa a meia altura no meio do gol, uma bola rasteira no canto ou uma ponte para cortar o cruzamento, ela será sempre a conclusão ideal da defesa. Tradicionalmente, a boa pegada é feita com as duas mãos abertas, com os polegares e indicadores formando um losango (ou balãozinho), separados por alguns centímetros. Para que a defesa seja segura, é necessário usar as palmas para aparar a bola enquanto os dedos ficam responsáveis pela força para controlá-la.

Nos meus bons tempos de profissional, ter uma boa pegada era condição sine qua non para um goleiro chegar ao time principal. Era inconcebível ver um goleiro espalmar um chute de meia-distância em cima dele, por mais forte que fosse. Infelizmente, somando os avanços tecnológicos da bola - sempre em prol dos atacantes - com o aumento da leniência da opinião pública e a ausência quase absoluta da teoria na preparação de goleiros, temos uma involução na técnica de defesa. Hoje em dia, rebater um chute que vem na cara é considerado uma defesa difícil.

Vivemos em um período onde é grande a valorização do fim, independente da forma para atingi-lo. Se o goleiro evitou o gol, já está bom. É para isso que ele está lá, certo? Errado! Assim como o centroavante é o primeiro defensor do time, o goleiro é o seu primeiro atacante. Uma defesa segura, além de não conceder uma segunda chance ao adversário, permite ao goleiro iniciar um contra-ataque. Além disso, com a técnica correta um goleiro pode chegar mais longe e mais rápido do que indo na bola de qualquer maneira. Sem ela, o goleiro até conseguirá defender as bolas mais fáceis, mas provavelmente não chegará nas mais difíceis.

Então o goleiro pode deixar para usar a técnica correta apenas nas bolas difíceis? Até pode - o Buffon é um cara que vez ou outra faz isso - mas isso apenas aumenta os riscos de uma bola teoricamente fácil. Tendo em vista as dificuldades geradas por atacantes adversários, fabricantes de bolas e os velhinhos da Football Association (responsáveis pelas regras do ludopédio oficial), creio não ser a melhor estratégia, mas vai do apetite por risco do cidadão.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Agruras da transmissão esportiva no Brasil

Ando ruminando sobre o assunto desde a final da Libertadores de 2009 e agora, com a confirmação da aquisição dos direitos de transmissão para o Brasil da Liga dos Campeões pela Globo, o gancho apareceu de novo. Para quem não sabe ou não lembra, a final do maior torneio das Américas aconteceu entre Cruzeiro e Estudiantes de La Plata e não teve transmissão ao vivo por TV aberta para São Paulo. A Globo, detentora dos direitos de transmissão, optou por passar Flamengo x Palmeiras, usando como argumento a baixa audiência da final de 2008, entre Fluminense e LDU. Pois bem, houve uma grita generalizada no meio, condenando a opção pelo IBOPE em detrimento do jornalismo. E aproveitando o ensejo, muita gente desceu a lenha na emissora por mágoas futebolísticas antigas, como o ufanismo das transmissões, o puxa-saquismo dos times de maior torcida de RJ e SP e a falta de conhecimento de futebol internacional.

Tenho um amigo publicitário que diz que se você não gosta de alguma coisa na TV é porque ela não foi feita para você. Ou seja, a Globo só faz esse populismo barato porque tem gente (e muita) que gosta e consome. A minoria que não gosta devia brigar para que o seu 'produto' (leia-se uma transmissão menos ufanista e marketeira) continuasse existindo, não para que o outro produto vire o seu. O consumidor não pode exigir que o Kuat vire Guaraná Antarctica, mas pode só comprar o Guaraná Antarctica.

O problema dessa teoria é que a Globo vem tendo um comportamento que é uma mistura de criança rica mimada com o Nada da História Sem Fim: vai engolindo tudo que tem em volta e não deixa ninguém mais brincar porque a bola é sua. Tudo em nome da audiência e da guerra contra o dízimo da Record. Eis a questão: como consumir outro produto se não há concorrência? A coisa aqui é mais profunda, pois a emissora carioca gosta de desafiar os limites da lei contra monopólios - já tendo sido inclusive punida por isso.

Ainda assim, é caso de se revoltar e fazer vudu com a Vênus platinada? No meu entendimento, NÃO! É caso de brigar com os donos do produto, que vendem seus direitos de transmissão com cláusulas de exclusividade absurdamente permissivas. É caso dos patrocinadores reclamarem que o produto está sendo desvalorizado por esse comportamento IBOPE-oriented e exigirem que isso não se repita. Afinal, a transmissão é apenas o distribuidor e não o produto em si. Se a Imbev resolver colocar gengibre na fórmula do Guaraná para combater um hipotético crescimento do Kuat com chá verde, não vai adiantar reclamar com o dono do bar.

O duro é que os donos do produto - clubes e federações - ainda não entenderam que o consumidor final não é a TV e nem os patrocinadores. É o torcedor. Ou talvez até tenham entendido, mas não tem lá muito interesse em mudar o status quo. Resultado: o produto futebol vem perdendo audiência há algum tempo e todo ano a Globo ameaça tirá-lo da grade.

E quer saber? Talvez a melhor coisa para o futebol brasileiro seja repassar o produto às TVs menores. Quem sabe não volta o tempo em que cada canal passava um jogo diferente.