segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Capítulo 4

Ajoelhado sobre o banco, agarrado na fitinha do Senhor do Bonfim e balbuciando algo que mais parecia uma prece para Xangô, Longdon assistiu estarrecido à manobra espetacular de seu pequeno motorista. O homenzinho havia desviado do Audi no último instante, aproveitando a brecha na frente de um caminhão-tanque da Petrobrás que demorou para acelerar e já ligava a seta para entrar na pista local. Unbelievable! Seus amigos de Harvard nunca acreditariam se ele contasse!

Alheio aos devaneios de seu passageiro, o homenzinho seguia à velocidade máxima pela via de acesso à pista local da Marginal Tietê – o que equivalia a 70 Km/H. À sua frente, a pista local apresentava um panorama parecido com o da pista expressa, mais adequado a um estacionamento do que a uma rodovia.

A fila da esquerda andou e ele embicou o carro antes de um velhinho meio cego em um Palio verde. Andou mais alguns metros e o Monza foi tragado pelo tráfego congestionado. Não havia mais saída possível pelos próximos 500 metros e, pelo andar da carruagem, levaria mais ou menos uma hora para percorrer essa distância.

--------------------

Um pouco atrás, o Escort e a Caravan protagonizavam um engavetamento de cinema, com perda total para as duas ximbicas. Curiosamente, apenas trincou a lanterna esquerda do Audi, embora a reação do seu dono sugerisse um dano muito maior. O boyzinho chutava e esmurrava o que havia sobrado do Escort quando um coreano saiu da Caravan. Com toda calma do mundo, sacou uma pistola, colocou o silenciador e deu um tiro certeiro no meio da testa do rapaz.

Assim que ele caiu, um negão de 2 metros de altura saiu do Escort com cara de assustado. Olhou em volta, viu que ninguém dava a mínima para o corpo estendido no chão e desanuviou o semblante.

- China do caralho, precisava ficar meia hora pondo o silenciador? Você só me fode, mesmo!

Enquanto o negão trocava o pneu do Audi, o oriental caminhou serenamente até o cadáver e extraiu as chaves do carro do bolso do boy. Viu que o celular do cara era um Nokia último modelo, com bluetooth, câmera, GPS e escova de dentes embutida e o recolheu também. Já se encaminhava para o banco do motorista quando o negão arrancou a chave da sua mão dizendo:

- Quem dirige sou eu! Você já fez muita merda hoje.

- Mas você também bateu sua ximbica, honorável colega.

- É, mas você bateu atrás. Nunca ouviu que quem bate atrás é sempre culpado?

Não tendo como discutir essa insofismável verdade milenar e vendo que a CET se aproximava do local do sinistro, o coreano se acomodou no banco do passageiro mesmo. Deu sorte, pois no porta-luvas encontrou um iPod de 800Gb de memória com visor de titânio cromado e fones sem fio, que embolsou prontamente.

O Audi saiu cantando o pneu, despertando a inveja de dez a cada dez motoristas ao redor.

Nenhum comentário:

Postar um comentário